Juião Bolseiro - Todas as cantigas

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Cancioneiros:

B 403bis, V 14bis

Descrição:

Tenção

Mestria

- Juïão, quero contigo fazer,
se tu quiseres, ũa entençom:
e querrei-te, na primeira razom,
ũa punhada mui grande poer
5eno rostro, e chamar-te rapaz
mui mao; e creo que assi faz
boa entençom quen'a quer fazer.
  
- Meem Rodriguiz, mui sem meu prazer
a farei vosc', assi Deus me perdom:
10ca vos haverei de chamar cochom,
pois que eu a punhada receber;
des i trobar-vos-ei mui mal assaz,
e atal entençom, se a vós praz,
a farei vosco mui sem meu prazer.
  
15- Juïão, pois [con]tigo começar
fui, direi-t'ora o que te farei:
ũa punhada grande te darei,
des i querrei-te muitos couces dar
na garganta, por te ferir peor,
20que nunca vilão haja sabor
doutra tençom comego começar.
  
- Meem Rodriguiz, querrei-m'emparar,
se Deus me valha, como vos direi:
coteife nojoso vos chamarei,
25pois que eu a punhada recadar;
des i direi, pois sô os couces for:
"Le[i]xade-m'ora, por Nostro Senhor",
ca assi se sol meu padr'a emparar.
  
- Juïão, pois que t'eu [ora] filhar
30pelos cabelos e que t'arrastrar,
ah que dez couces te presentarei!
  
- Meem Rodriguiz, se m'eu trosquiar,
ou se me fano, ou se m'encostar,
ai, trobador, já vos nom tornarei!


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Cancioneiros:

B 1076, V 667
(C 1076)

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Ai mia senhor! tod'o bem mi a mi fal,
mais nom mi fal gram coita, nem cuidar,
des que vos vi, nem mi fal gram pesar;
mais nom mi valha O que pod'e val,
5       se hoj'eu sei onde mi venha bem,
       ai mia senhor, se mi de vós nom vem!
  
Nom mi fal coita, nem vejo prazer,
senhor fremosa, des que vos amei,
mais a gram coita que eu por vós hei,
10já Deus, senhor, nom mi faça lezer,
       se hoj'eu sei onde mi venha bem,
       ai mia senhor, se mi de vós nom vem!
  
Nem rem nom podem veer estes meus
olhos no mund'[ond'] eu haja sabor,
15sem veer vós; e nom mi val[h]'Amor,
nem mi valhades vós, senhor, nem Deus,
       se hoj'eu sei onde mi venha bem,
       ai mia senhor, se mi de vós nom vem!


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Cancioneiros:

B 1165, V 771
(C 1165)

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Sem meu amigo manh'eu senlheira,
e sol nom dormem estes olhos meus,
e, quant'eu posso, peç'a luz a Deus
e nom mi a dá, per nulha maneira,
5       mais, se masesse com meu amigo,
       a luz agora seria migo.
  
Quand'eu com meu amigo dormia,
a noite nom durava nulha rem,
e ora dur'a noit'e vai e vem,
10nom vem [a] luz nem parec'o dia,
       mais, se masesse com meu amigo,
       a luz agora seria migo.
  
E segundo com'a mi parece,
u migo mam meu lum'e meu senhor,
15vem log'a luz, de que nom hei sabor,
e ora vai noit'e vem e crece;
       mais, se masesse com meu amigo,
       a luz agora seria migo.
  
Pater Nostrus rez'eu mais de cento
20por Aquel que morreu na vera cruz,
que el mi mostre mui ced[o] a luz,
mais mostra-mi as noites d'Avento;
       mais, se masesse com meu amigo,
       a luz agora seria migo.


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Cancioneiros:

B 1166, V 772

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Da noite d'eire poderam fazer
grandes três noites, segundo meu sem,
mais na d'hoje mi vẽo muito bem,
       ca vẽo meu amigo,
5e, ante que lh'uviasse dizer rem,
       vẽo a luz e foi logo comigo.
  
E pois m'eu eire senlheira deitei,
a noite foi e vẽo e durou,
mais a d'hoje pouco a semelhou,
10       ca vẽo meu amigo,
e, tanto que mi a falar começou,
       vẽo a luz e foi logo comigo.
  
E comecei eu eire de cuidar
[e] começou a noite de crecer,
15maila d'hoje nom quis assi fazer,
       ca vẽo meu amigo,
e, faland'eu com el a gram prazer,
       vẽo a luz e foi logo comigo.


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Cancioneiros:

B 1167, V 773

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Fui hoj'eu, madre, veer meu amigo,
que envio[u] muito rogar por en,
porque sei eu ca mi quer mui gram bem;
mais vedes, madre, pois m'el vio consigo,
5       foi el tam ledo que, des que naci,
       nunca tam led'home com molher vi.
  
Quand'eu cheguei, estava el chorando
e nom folgava o seu coraçom,
cuidand'em mi, se iria, se nom,
10mais, pois m'el viu, u m'el estava asperando,
       foi el tam ledo que, des que naci,
       nunca tam led'home com molher vi.
  
E, pois Deus quis que eu fosse u m'el visse,
diss'el, mia madre, como vos direi:
15"Vej'eu viir quanto bem no mund'hei";
e vedes, madre, quand'el esto disse,
       foi tam ledo que, des que eu naci,
       nunca tam led'home com molher vi.


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Cancioneiros:

B 1168, V 774

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Nas barcas novas foi-s'o meu amigo daqui,
e vej'eu viir barcas e tenho que vem i,
       mia madre, o meu amigo.
  
Atendamos, ai madr', e sempre vos querrei bem,
5ca vejo viir barcas e tenho que i vem,
       mia madre, o meu amigo.
  
Nom faç'eu desguisado, mia madr', em o cuidar,
ca nom podia muito sem mi alhur morar,
       mia madre, o meu amigo.


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Cancioneiros:

B 1169, V 775

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão, Dialogada

- Vej'eu, mia filha, quant'é meu cuidar,
as barcas novas viir pelo mar,
       em que se foi voss'amigo daqui.
- Nom vos pês, madre, se Deus vos empar,
5       irei veer se vem meu amig'i.
  
- Cuid'eu, mia filha, no meu coraçom,
das barcas novas, que aquelas som
       em que se foi voss'amigo daqui.
- Nom vos pês, madre, se Deus vos perdom,
10       irei veer se vem meu amig'i.
  
- Filha fremosa, por vos nom mentir,
vej'eu as barcas pelo mar viir
       em que se foi voss'amigo daqui.
- Nom vos pês, madre, quant'eu poder ir,
15       irei veer se vem meu amig'i.


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Cancioneiros:

B 1170, V 776

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Que olhos som que vergonha nom ham,
dized', amigo, doutra, ca meu nom,
e dized'ora, se Deus vos perdom:
pois que vos já com outra preço dam,
5       com[o] ousastes viir ant'os meus
       olhos, amigo, por amor de Deus?
  
Ca vós bem vos devía[des] nembrar
em qual coita vos eu já por mi vi,
fals', e nembra[r]-vos qual vos fui eu i;
10mais, pois com outra fostes começar,
       com[o] ousastes viir ant'os meus
       olhos, amigo, por amor de Deus?
  
Par Deus, falso, mal se mi gradeceu,
quando vós houvérades de morrer
15se eu nom fosse, que vos fui veer;
mais, pois vos outra já de mim venceu,
       com[o] ousastes viir ant'os meus
       olhos, amigo, por amor de Deus?
  
Nom mi há mais vosso preito mester,
20e ide-vos já, por Nostro Senhor,
e nom venhades nunca u eu for;
pois começastes com outra molher,
       com[o] ousastes viir ant'os meus
       olhos, amigo, por amor de Deus?


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Cancioneiros:

B 1171, V 777

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Refrão

Mal me tragedes, ai filha, por que quer'haver amigo,
e, pois eu, com vosso medo, nom o hei nem é comigo,
       nom hajade'la mia graça,
       e dê-vos Deus, ai mia filha,
5       filha que vos assi faça,
       filha que vos assi faça.
  
Sabedes ca, sem amigo, nunca foi molher viçosa,
e, porque mi o nom leixades haver, mia filha fremosa,
       nom hajade'la mia graça,
10       e dê-vos Deus, ai mia filha,
       filha que vos assi faça,
       filha, que vos assi faça.
  
Pois eu nom hei meu amigo, nom hei rem do que desejo,
mais, pois que mi por vós vẽo, mia filha, que o nom vejo,
15       nom hajade'la mia graça,
       e dê-vos Deus, ai mia filha,
       filha que vos assi faça,
       filha, que vos assi faça.
  
Per vós perdi meu amigo, por que gram coita padesco,
20e, pois que mi o vós tolhestes e melhor ca vós paresco,
       nom hajade'la mia graça,
       e dê-vos Deus, ai mia filha,
       filha que vos assi faça,
       filha, que vos assi faça.


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Cancioneiros:

B 1172, V 778

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Buscastes-m', ai amigo, muito mal
ali u vos enfengistes de mi,
e rog'a Deus que mi perçades i;
e dized'ora, falso, desleal:
5       se vos eu fiz no mund'algum prazer,
       que coita houvestes vós de o dizer?
  
E nom vos presta, fals', em mi o negar
nem mi o neguedes, ca vos nom tem prol,
nem juredes, ca sempr'o falso sol
10jurar muit', e dizede sem jurar:
       se vos eu fiz no mund'algum prazer,
       que coita houvestes vós de o dizer?
  
O que dissestes, se vos eu ar vir
por mi coitado, como vos vi já,
15vedes, fals', acoomiar-xi-vos-á;
mais dized'ora, sem todo mentir:
       se vos eu fiz no mund'algum prazer,
       que coita houvestes vós de o dizer?


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Cancioneiros:

B 1173, V 779

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Fez ũa cantiga d'amor
ora meu amigo por mi,
que nunca melhor feita vi,
mais, como x'é mui trobador,
5       fez ũas lirias no som
       que mi sacam o coraçom.
  
Muito bem se soube buscar
por mi ali, quando a fez,
em loar-mi muit'e meu prez,
10mais, de pram, por xe mi matar,
       fez ũas lirias no som
       que mi sacam o coraçom.
  
Per bõa fé, bem baratou
de a por mi bõa fazer,
15e muito lho sei gradecer,
mais vedes de que me matou:
       fez ũas lirias no som
       que mi sacam o coraçom.


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Cancioneiros:

B 1174, V 780

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Ai madre, nunca mal senti[u],
nem soubi que x'era pesar,
a que seu amigo nom viu,
com'hoj'eu vi o meu, falar
5       com outra, mais poilo eu vi,
       com pesar houvi a morrer i.
  
E, se molher houve d'haver
sabor d'amigo, u lho Deus deu,
sei eu que lho nom fez veer,
10com'a mi fez vee'lo meu,
       com outra, mais poilo eu vi,
       com pesar houvi a morrer i.


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Cancioneiros:

B 1175, V 781

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Ai meu amigo, meu, per bõa fé,
e nom doutra, per bõa fé, mais meu,
rog'eu a Deus, que mi vos hoje deu,
que vos faça tam ledo seer migo
5       quam leda fui hoj'eu, quando vos vi,
       ca nunca fui tam leda pois naci.
  
Bom dia vejo, pois vos vej'aqui,
meu amigo, meu, a la fé, sem al;
faça-vos Deus ledo, que pod'e val,
10seer migo, meu bem e meu desejo,
       quam leda fui hoj'eu, quando vos vi,
       ca nunca fui tam leda pois naci.
  
Meu gasalhado, se mi valha Deus,
e amigo meu e meu coraçom,
15faça-vos Deus em algũa sazom
seer migo tam led'e tam pagado
       quam leda fui hoj'eu, quando vos vi,
       ca nunca fui tam leda pois naci.
  


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Cancioneiros:

B 1176, V 782

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Aquestas noites tam longas que Deus fez em grave dia
por mim, por que as nom dórmio, e por que as nom fazia
       no tempo que meu amigo
       soía falar comigo?
  
5Porque as fez Deus tam grandes, nom posso eu dormir, coitada,
e, de como som sobejas, quisera-m'outra vegada
       no tempo que meu amigo
       soía falar comigo.
  
Porque as Deus fez tam grandes, sem mesura, desiguaes,
10e as eu dormir nom posso, por que as nom fez ataes
       no tempo que meu amigo
       soía falar comigo?


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Cancioneiros:

B 1178, V 783

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Ai meu amigo, havedes vós per mi
afã e coit'e desej'e nom al,
e o meu bem é todo vosso mal;
mais, pois vos eu nom posso valer i,
5       pesa-mi a mi porque paresco bem,
       pois end'a vós, meu amigo, mal vem.
  
E sei, amigo, destes olhos meus
e sei do meu fremoso parecer
que vos fazem em gram coita viver;
10mais, meu amigo, se mi valha Deus,
       pesa-mi a mi porque paresco bem,
       pois end'a vós, meu amigo, mal vem.


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Cancioneiros:

B 1179, V 784

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Partir quer migo mia madr'hoj'aqui
quant'há no mund', u outra rem nom jaz:
de vós, amig', ũa parte mi faz,
e faz-m'outra de quant'há e de si;
5       e, pois faz esto, manda-m'escolher;
       que mi mandades, amigo, fazer?
  
Partir quer migo como vos direi:
de vós mi faz [i] ũa parte já
e faz-m'outra de si e de quant'há
10e de quantos outros parentes hei;
       e, pois faz esto, manda-m'escolher;
       que mi mandades, amigo, fazer?
  
E de qual guisa migo partir quer
a partiçom, ai meu amig', é tal:
15ũa me faz, senhor, de vós, sem al,
outra de si e de quant'al houver;
       e, pois faz esto, manda-m'escolher;
       que mi mandades, amigo, fazer?
  
De vós me faz ũa parte, ai senhor
20e meu amig'e meu lum'e meu bem,
e faz-m'outra de grand'algo que tem
e pom-me demais i o seu amor;
       e, pois faz esto, manda m'escolher;
       que mi mandades, amigo, fazer?
  
25E, poilo ela part', a meu prazer,
em vós quer'eu, meu amig', escolher.


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Cancioneiros:

B 1180, V 785

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Nom perdi eu, meu amigo, des que me de vós parti,
do meu coraçom gram coita, nem gram pesar, mais perdi
       quanto tempo, meu amigo,
       vós nom vivestes comigo.
  
5Nem perderam os olhos meus chorar nunca, nem eu mal,
des que vos vós daqui fostes, mais vedes que perdi al:
       quanto tempo, meu amigo,
       vós nom vivestes comigo.


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Cancioneiros:

B 1181, V 786

Descrição:

Tenção

Mestria

- Joam Soárez, de pram as melhores
terras andastes, que eu nunca vi:
d'haverdes donas por entendedores
mui fremosas, quaes sei que há i,
5fora razom; mais u fostes achar
d'irdes por entendedores filhar
sempre quand'amas, quando tecedores?
  
- Juião, outros mais sabedores
quiserom já esto saber de mim,
10e em todo trobar mai[s] trobadores
que tu nom és; mais direi-t'o que vi:
vi boas donas tecer e lavrar
cordas e cintas, e vi-lhes criar,
per bõa fé, mui fremosas pastores.
  
15- Joam Soárez, nunca vi chamada
molher ama, nas terras u andei,
se por emparament'ou por soldada
nom criou mês, e mais vos en direi:
enas terras u eu soía viver,
20nunca mui bõa dona vi tecer,
mais vi tecer algũa lazerada.
  
- Juião, por est', outra vegada,
com outro tal trobador entencei;
fiz-lhe dizer que nom dezia nada,
25com'or'a ti desta tençom farei;
vi boas donas lavrar e tecer
cordas e cintas, e vi-lhes teer
mui fremosas pastores na pousada.
  
- Joam Soárez, u soía viver,
30nom tecem donas, nem ar vi teer
berç'ant'o fog'a dona muit'honrada.
  
- Juião, tu deves entender
que o mal vilam nom pode saber
de fazenda de bõa dona nada.