Pero da Ponte

Rubrica:

  

Esta cantiga fez Pero da Ponte ao infante Dom Manuel, que se começa "E mort'é Martim Marcos", e na cobra segunda o podem entender.


Mort'é Dom Martim Marcos?! Ai Deus, se é verdade?
 sei ca, se el é morto, morta é torpidade,
 morta é bavequia | e morta neicidade,
morta é covardia | e morta é maldade.
  
5Se Dom Martinh'é morto, sem prez e sem bondade,
 oimais, maos costumes, outro senhor catade;
mais no-no acharedes | de Roma atá Cidade:
se tal senhor queredes, | alhu'lo demandade.
  
Pero um cavaleiro sei eu, par caridade,
10que vos ajudari'a tolher del soidade;
mais, que vos diga [o]nde | [é], bem [adevinh]ade:
nom éste rei nem conde, | é-x'outra podestade,
  
que nom direi, que direi, que nom direi...
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Nota geral:

Pranto de escárnio com um alvo duplo, já que a sátira é endereçado, conjuntamente, a este D. Martim Marcos e, na forma desviada que a rubrica explica, ao infante D. Manuel, irmão mais novo de Afonso X. Como se vê na cobra segunda referida na dita rubrica, a morte deste (pouco) saudoso Martim Marcos é apenas o pretexto para traçar o retrato de um outro senhor, "sósia" em vícios - e para, ao mesmo tempo, defender politicamente o soberano, então em conflito com o seu herdeiro, o infante Sancho, cujo partido D. Manuel apoiou.
Atendendo à cronologia deste conflito, e ao facto de D. Manuel (na cantiga, ainda vivo) ter falecido em 1283, a composição datará dos anos 1277-1282. Um estudo recente de Fabio Barberini (2020)2 analisa mais detalhadamente estas datas e circunstâncias
A composição foi editada por Lapa1 numa única estrofe (o que o leva a fazer a sugestão de que lhe faltaria uma segunda). Embora a sua disposição nos manuscritos não seja muito clara, estamos em crer que a edição em três estrofes e um finda, proposta por Panunzio3, será a mais provável. Também Martinho Santalha, numa edição de1995 (retomada em 20244), considera 3 estrofes na cantiga, mas com uma disposição diferente: em lugar dos 4 versos de Panunzio3, edita a cantiga com estrofes de 6 versos (4 de refrão). Mas o facto de a sátira ser visivelmente um contrafactum musical de um sirventès do célebre trovador provençal Peire Cardinal, composto por versos longos, leva-nos a optar também por esta medida (pode ver aqui: Cantigas de Seguir. Modelos occitânicos e franceses as duas composições e a música).
Sobre estas questões de rimas internas e externas e a sua relação com a música pode ainda consultar o artigo de Manuel Pedro Ferreira, abaixo indicado5.

Referências

1 Lapa, Manuel Rodrigues (1970), Cantigas d´Escarnho e de Maldizer dos Cancioneiros Medievais Galego-Portugueses, 2ª Edição, Vigo, Editorial Galaxia.

2 Barberini, Fabio (2020), "Pero da Ponte e l’Infante D. Manuel (B1655/V1189)", in Cultura Neolatina, LXXX, 1-2 , Modena, STEM Mucchi Editore Srl.
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3 Panunzio, Saverio (1967), Pero da Ponte. Poesías, Bari, Adriatica Editrici.

4 Montero Santalha, José-Martinho (2024), A cantiga de escárnio de Pero da Ponte «Mort’ é Dom Martim Marcos?! Ai Deus, se é verdade?» [= 1667 = Tav 120,27] (Ba 1655, V [1189]).
      Aceder à página Web


5 Ferreira, Manuel Pedro (2023), "Internal and External Rhymes in Galician-Portuguese Cantigas: Musical Strategies", in La rima tra filologia, metrica e musica dal Medioevo al Rinascimento.
      Aceder à página Web




Nota geral


Descrição

Pranto de escárnio
Mestria
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 1655, V 1189

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 1655

Cancioneiro da Vaticana - V 1189


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas