Afonso Lopes de Baião

Rubrica:

Cantigas que fez Dom Afonso López de Baiam d'escarnh'e de maldizer.


  d'Alvelo que era casado
mais nõn'o creo, se Deus mi perdom;
e quero-vos logo mostrar razom,
que entendades que digo recado:
5ca lh'oí eu muitas vezes jurar
que tam pastor nom podia casar;
e por en creo que nom é casado.
  
Sabia-m'eu ca x'era esposado
mais há d'um ano, nom dig'eu de nom,
10ca mi mostrou el bem seu coraçom,
per quanto el a mi havia jurado:
que, mentr'atam pastor fosse com'é,
que nom casaria, per boa fé;
mais esposou-s'e anda esposado.
  
15E seus parentes têm por guisado
que se casass'há i gram sazom;
os que lho dizem diz-lhis el entom:
- Do que dizedes nom sõo pagado,
ca me nom podedes tanto coitar
20que eu tam pastor quisesse casar;
mais casarei quand'[o] houver guisado.
  
De me coitardes fazedes mal sem,
ca nom podedes já, per nulha rem,
que per mi seja o preito juntado.



 ----- Aumentar letra ----- Diminuir letra

Nota geral:

Sátira dirigida a um cavaleiro, provavelmente já de idade madura, renitente aos laços do matrimónio, o que justificava alegando ser ainda muito jovem. A cantiga, que devia ser clara para os contemporâneos, não nos oferece muitos dados sobre o contexto que explicaria esta renitência. Mas, se este Alvelo é, como sugeriu Carolina Michaelis1, Martim Martins Alvelo, a cantiga aludiria ironicamente às suas próprias origens bastardas, ou seja, a uma tendência familiar para viver em mancebia: com efeito, já o seu avô, Sueiro Pires da Maia, não se tinha casado, tendo tido, no entanto, numerosos filhos de barregãs (entre os quais o seu pai, Martim Soares de Baguim, o Narizes), dando assim origem não só aos de Baguim, mas também a duas outras linhagens da pequena nobreza, os Canelas e os Gaia.
Acrescente-se que a este mesmo Martim Alvelo é dirigida uma outra composição satírica, da autoria de João Soares Coelho, onde a questão da idade é igualmente central.

Referências

1 Vasconcelos, Carolina Michaëlis de (2004), "O processo da ama", in Glosas Marginais ao Cancioneiro Medieval Português (trad. do texto de 1905) , Coimbra, Acta Universitatis Conimbrigensis, pp. 87-88.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Escárnio e maldizer
Mestria
Cobras uníssonas
Dobre: casado, esposado, guisado (vv. 1 e 7 de cada estrofe)
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 1469, V 1079
(C 1469)

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 1469

Cancioneiro da Vaticana - V 1079


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas