Estêvão da Guarda


Em tal perfia qual eu nunca vi,
vi eu Dom Foam com sa madr'estar;
e, porque os vi ambos perfiar,
cheguei-m'a el e dixi-lhi log'i:
5- Vencede-vos a quanto vos disser,
 ca perfiardes nom vos é mester
com vossa madr'- e perfiar assi!
  
E disse-m'el: - Sempr'esto houvemos d'uso,
eu e mia madre, em nosso solaz,
10de perfiarmos eno que nos praz;
e quando m'eu de perfiar escuso,
assanha-se e diz-m'o que vos direi:
- Se nom perfias eu te maldirei
que sejas sempre maldito e confuso.
  
15E dix'eu: - Senhor, nom vos está bem
de perfiardes, mais está-vos mal
com vossa madr'. E diss'el: - Nem mi cal,
poilo ela por sa prol assi tem;
ca se lh'eu dig': - Al tenho de fazer -
20por bem ou mal tanto m'há-de dizer
que, na cima, perfiar me convém.
  
 E parávoas nom ham de falecer;
mais tanto havemos de noite a seer
  que é meiada ou mui preto en.



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Nota geral:

Esta cantiga alude a um tema "ousado": as relações incestuosas entre uma mãe e um filho. É no duplo sentido do termo perfiar (brigar, discutir) que assenta o equívoco.
Como curiosidade, refira-se que no Livro Velho de Linhagens há uma referência a uma (dramática) relação incestuosa deste género, protagonizada por D. Maria Anes, a Malfadada (filha do trovador João Soares de Pávia), cujo filho, Mourão Nunes, a matou porque lhe disse que não [jouvesse?] com outrem (LV 1BU10). Mas dificilmente se tratará deste caso, já que os dados cronológicos parecem impedi-lo, Estêvão da Guarda trovando em data muito posterior.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Escárnio e maldizer
Mestria
Cobras singulares
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 1320, V 925

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 1320

Cancioneiro da Vaticana - V 925


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas