João Mendes de Briteiros


Ora vej'eu que nom há verdade
em sonh', amiga, se Deus me perdom,
e quero-vos logo mostrar razom,
e vedes como, par caridade:
5       sonhei, muit'há, que veera meu bem
       e meu amig', e nom veo nem vem.
  
 Ca nom há verdade nemigalha
em sonho, nem sol nom é bem nem mal,
 e eu nunca ende creerei al,
10porque, amiga, se Deus me valha,
       sonhei, muit'há, que veera meu bem
       e meu amig', e nom veo nem vem.
  
Per mim, amiga, entend'eu bem que
sonho nom pode verdade seer,
15nem que m'er pode bem nem mal fazer,
porque, amiga, se Deus bem mi dê,
       sonhei, muit'há, que veera meu bem
       e meu amig', e nom veo nem vem.
  
E, pois se foi meu amig'e nom vem,
20meu sonh', amiga, nom é mal nem bem.



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Nota geral:

Na sequência da cantiga anterior, a donzela diz agora à sua amiga ter percebido que não há qualquer verdade nos sonhos, pois o seu amigo, ao contrário do que há muito sonhou, não veio nem vem. Ou seja, como conclui na finda, face à realidade, os sonhos são irrelevantes.
Não deixa de ser notável este ceticismo face aos sonhos, numa época em que eles desempenhavam por vezes um papel importante na vida pessoal ou mesmo política (sendo objeto de complexas interpretações por parte de adivinhadores ou curiosos, como se vê, aliás, em grande parte das novelas de cavalaria).



Nota geral


Descrição

Cantiga de Amigo
Refrão
Cobras singulares
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 866, V 452

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 866

Cancioneiro da Vaticana - V 452


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas