Martim Anes Marinho - Todas as cantigas

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Cancioneiros:

B 1621, V 1154
(C 1621)

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Mestria

Ena primeira rua que cheguemos,
guarnir-nos-á Dom Foam mui bem
d'um pan'estranho que todos sabemos,
d'ũa ucha pere[nal] que [i] tem;
5e as calças seram de melhor pano:
feitas seram de névoa d'antano;
e nós de chufas guarnidos seremos.
  
E prometeu-m'el ũa bõa capa,
ca nom destas maas feitas de luito,
10mais outra bõa, feita de gualdrapa,
cintada, e de nom pouco nem muito;
e ũa pena, nom destas mizcradas,
mais outra bõa, de chufas paradas;
já m'eu daqui nom irei sem a capa.
  
15Viste'lo potro coor de mentira,
que mi antano prometeu em Janeiro,
que nunca home melhor aqui vira?
Criado foi em Castro Mentireiro.
E prometeu-m'ũas armas entom,
20nom destas maas feitas de León,
mais melhores, d'Outeir'em Freixeeiro.
  
Com grande labor, mi deu a loriga,
e toda era de chufas viada;
e como quer que vos end'eu al diga,
25nunca mi a home viu na pousada;
e [atam] cravelada de mensonha
e tam lev'era, que bem de Coronha
a trageria aqui ũa formiga.
  
E prometeu-m'ũa arma preçada,
30como dizem os que a conhocerom;
"gualdrapa Fariz" havia nom'a espada,
de mouros foi, nom sei u x'a perderom;
e pelo pão mi prometeu log'i
de nevoeiro, e eu lho recebi,
35que me pagass', a seu poder, de nada.
  
[De preç'e com labor foi a loriga
que m'el mandou e de parla viada;
mais como quer que vo-lo homem diga,
nunca a mim virom teer na pousada:
40bem cravelada e[ra] de zamponha,
des i tam leve, que bem de Monçonha
mi a aduria aqui ũa formiga.]