João Airas de Santiago - Todas as cantigas

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Cancioneiros:

B 942, V 530
(C 942)

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

De me preguntar ham sabor
muitos, e dizem-mi por en
com'estou eu com mia senhor;
e direi-vos eu que m'avém:
5       se disser "bem", mentir-lhis-ei;
       tam mal é que o nom direi.
  
Os que me vêm preguntar
como mi vai, querem saber,
com esta que sei muit'amar;
10e eu nom sei que lhis dizer:
       se disser "bem", mentir-lhis-ei;
       tam mal é que o nom direi.
  
Os meus amigos, com que vou
falar, me preguntam assi:
15com mia senhor, com'eu estou?,
e nom sei que lhis diga i;
       se disser "bem", mentir-lhis-ei;
       tam mal é que o nom direi.
  
Mais, pois dela bem nom hei,
20preguntar-m'-am e calar-m'-ei.


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Cancioneiros:

B 943, V 531

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Tam grave m'é, senhor, que morrerei,
a mui gram coita que, per boa fé,
levo por vós, e a vós mui grav'é;
pero, senhor, verdade vos direi:
5       se vos grave é de vos eu bem querer,
       tam grav'é a mi, mais nom poss'al fazer.
  
Tam grave m'é esta coita em que me tem
o voss'amor, que nom lh'hei de guarir,
e a vós grav'é sol de o oir;
10pero, senhor, direi-vos que mi avém:
       se vos grave é de vos eu bem querer,
       tam grav'é a mi, mais nom poss'al fazer.
  
Tam grave m'é, que nom atendo já
de vós senom mort'ou mui gram pesar,
15e grav'é a vós de vos [eu] coitar;
pero, senhor, direi-vos quant'i há:
       se vos grave é de vos eu bem querer,
       tam grav'é a mi, mais nom poss'al fazer.


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Cancioneiros:

B 944, V 532

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Dizem, senhor, que nom hei eu poder
de veer bem e, por vos nom mentir,
gram verdad'é, quand'eu alhur guarir
hei sem vós, que nom posso bem haver;
5       mais, mia senhor, direi-vos ũa rem:
       pois eu vos vejo, muito vejo bem.
  
Travam em mim e em meu conhocer
e dizem que nom vejo bem, senhor,
e verdad'é, seed'en sabedor,
10u eu alhur sem vós hei de viver;
       mais, mia senhor, direi-vos ũa rem:
       pois eu vos vejo, muito vejo bem.
  
D'haver bem nom me quero eu creer
e, mia senhor, quero-vos dizer al:
15vejo mui pouco e sei que vejo mal
u nom vejo vosso bom parecer;
       mais, mia senhor, direi-vos ũa rem:
       pois eu vos vejo, muito vejo bem.


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Cancioneiros:

B 945, V 533

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Com coitas d'amor, se Deus mi perdom,
trob', e dizem que meus cantares nom
valem rem, porque [a]tam muitos som;
       mais muitas coitas mi os fazem fazer;
5       e tantas coitas, quantas de sofrer
       hei, non'as posso em um cantar dizer.
  
Muitas hei, hei cuidad'e se mi sal,
e faço muitos cantares, em tal
que per[ç]a coitas, e dizem-mi mal,
10       mais muitas coitas mi os fazem fazer;
       e tantas coitas, quantas de sofrer
       hei, non'as posso em um cantar dizer.
  
E[m] muito[s] cantares tenho que bem
posso dizer mias coitas, e por en
15dizem-mi ora que faço i mal sem;
       mais muitas coitas mi os fazem fazer;
       e tantas coitas, quantas de sofrer
       hei, non'as posso em um cantar dizer.
  
Ca, se cuidar i, já mentre viver
20bem cuido que as nom possa dizer.


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Cancioneiros:

B 946, V 534

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Vi eu donas, senhor, em cas d'el-rei,
fremosas e que pareciam bem,
e vi donzelas muitas u andei;
e, mia senhor, direi-vos ũa rem:
5       a mais fremosa de quantas eu vi,
       long'estava de parecer assi
  
come vós. Eu muitas vezes provei
se ac[h]aria de tal parecer
algũa dona, senhor, u andei;
10e mia senhor, quero-vos al dizer:
       a mais fremosa de quantas eu vi,
       long'estava de parecer assi
  
come vós. E, mia senhor, preguntei
por donas muitas, que oí loar
15de parecer, nas terras u andei;
e, mia senhor, pois mi as fo[rom] mostrar:
       a mais fremosa de quantas eu vi,
       long'estava de parecer assi.


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Cancioneiros:

B 947, V 535

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Nom vi molher, des que naci,
tam muito guardada com'é
a mia senhor, per boa fé;
mais, pero a guardam assi,
5       quantos dias no mundo som,
       alá vai o meu coraçom.
  
De sa madre sei ũa rem:
que a manda muito guardar
de mi e d'outrem alá entrar;
10mais, pero a guarda mui bem,
       quantos dias no mundo som,
       alá vai o meu coraçom.
  
Do[s] que a guardam sei eu já
que lhis nom pod'home alá ir;
15mais direi-vos, per nom mentir,
pero mui guardada está,
       quantos dias no mundo som,
       alá vai o meu coraçom.
  
E pesa-mi a mim, porque nom
20posso ir u vai meu coraçom.


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Cancioneiros:

B 948, V 536

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Andei, senhor, Leon e Castela
depois que m'eu desta terra quitei,
e nom foi i dona nem donzela
que eu nom viss', e mais vos en direi:
5       quantas mais donas, senhor, alá vi,
       tanto vos eu mui mais precei des i.
  
[E] quantas donas eu vi, des quando
me foi daqui, punhei de as cousir,
e, poilas vi, estive cuidando
10em vós, senhor, e por vos nom mentir,
       quantas mais donas, senhor, alá vi,
       tanto vos eu mui mais precei des i.
  
E as que alá maior prez haviam
em todo bem, tôdalas fui veer,
15e cousi-as, e bem pareciam,
pero, senhor, quero-vos al dizer:
       quantas mais donas, senhor, alá vi,
       tanto vos eu mui mais precei des i.


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Cancioneiros:

B 949, V 537

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Pero tal coita hei d'amor
que maior nom pod'hom'haver,
nom moiro nem hei en sabor,
nem morrerei, a meu poder:
5       porque sempr'atend'haver bem
       da dona que quero gram bem.
  
E os que mui coitados som
d'amor, desejam a morrer,
mais eu, assi Deus mi perdom,
10queria gram sazom viver:
       porque sempr'atend'haver bem
       da dona que quero gram bem.
  
Mal sem é per desasperar
home de mui gram bem haver
15de sa senhor, que lhi Deus dar
pod', e non'o quer'eu fazer:
       porque sempr'atend'haver bem
       da dona que quero gram bem.
  
E quem deseja mort'haver
20por coita d'amor nom faz sem,
nen'o tenh'eu por de bom sem.


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Cancioneiros:

B 950, V 538

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Ouço dizer dos que nom ham amor
que tam bem podem jurar que o ham,
ant'as donas, come mim ou melhor;
mais pero [o] jurem nom lho creerám,
5       ca nunca pod'o mentiral tam bem
       jurar come o que verdade tem.
  
Bem jura[m eles] que a[s] sabem amar,
senom que nom hajam delas prazer;
mais que lhis val de assi jurar?
10Pero o jurem, nom lho querrám creer,
       ca nunca pod'o mentiral tam bem
       jurar come o que verdade tem.
  


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Cancioneiros:

B 951, V 539

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Maravilho-m'eu, si Deus mi dê bem,
senhor, por quanto vos vejo rogar
Nostro Senhor, e vim-vos preguntar
que mi digades, por Deus, ũa rem:
5       em que vos podia Nostro Senhor
       fazer mais bem do que vos fez, senhor?
  
Fez-vos bem falar e bem parecer
e comprida de bem, per bõa fé,
10e rogades Deus, nom sei por que é;
e, mia senhor, quero de vós saber
       em que vos podia Nostro Senhor
       fazer mais bem do que vos fez, senhor?
  
15Ca vos fez mansa e de mui bom prez,
e já em vós mais bem nom poderá
haver; pois por que O rogades já?
Ca, pois que vos El tam muito bem fez,
       em que vos podia Nostro Senhor
20       fazer mais bem do que vos fez, senhor?
  
Eu, cativo, mui coitado d'amor,
havia que rogar Nostro Senhor,
25que m[i] fez sempre viver sem sabor,
e sem vosso bem-fazer, mia senhor.


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Cancioneiros:

B 952, V 540

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Senhor fremosa, hei-vos grand'amor,
e os que sabem que vos quero bem
têm que vos pesa mais doutra rem;
e eu tenho, fremosa mia senhor,
5       mui guisado de vos fazer pesar,
       se vos pesa de vos eu muit'amar.
  
Ca já vos sempr'haverei de querer
bem, e estas gentes que aqui som
têm que vos pesa de coraçom;
10e eu tenho já, enquanto viver,
       mui guisado de vos fazer pesar,
       se vos pesa de vos eu muit'amar.
  
Ca, mia senhor, sempre vos bem querrei,
e aquestas gentes que som aqui
15têm que vos faço gram pesar i;
e [eu] tenh'ora, e sempre terrei,
       mui guisado de vos fazer pesar,
       se vos pesa de vos eu muit'amar.
  
Ca vos nom posso, senhor, desamar,
20nem poss'amor, que me força, forçar.


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Cancioneiros:

B 953, V 541

Descrição:

Cantiga de Amor

Mestria

Desej'eu bem haver de mia senhor,
mais nom desej'haver bem dela tal,
por seer meu bem, que seja seu mal;
e por aquesto, par Nostro Senhor,
5nom queria que mi fezesse bem
em que perdesse do seu nulha rem,
ca nom é meu bem o que seu mal for.
  
Ante cuid'eu que o que seu mal é
que meu mal est, e cuido gram razom;
10por en desejo no meu coraçom
haver tal bem dela, per bõa fé,
em que nom perça rem de seu bom prez,
nem lh'ar diga nulh'home que mal fez,
e outro bem Deus dela nom mi dé.
  
15E já eu muitos namorados vi
que nom davam nulha rem por haver
sas senhores mal, pois a si prazer
faziam, e por esto dig'assi:
se eu mia senhor amo polo meu
20bem e nom cato a nulha rem do seu,
nom am'eu mia senhor, mais amo mi.
  
E mal mi venha se atal fui eu,
ca, des que eu no mund'andei por seu,
amei sa prol muito mais ca de mi.


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Cancioneiros:

B 954/955, V 542

Descrição:

Cantiga de Amor

Mestria

Que grave m'est ora de vos fazer,
senhor fremosa, um mui gram prazer,
ca me quer'ir longi de vós viver,
e venho-vos, por esto, preguntar:
5que prol há [a] mim fazer-vos eu prazer
e fazer a mim, senhor, gram pesar?
  
Sei que vos praz muito ir-m'eu daquém,
ca dizedes que nom é vosso bem
de morar preto de vós; e por en
10quero de vós que mi digades al:
que prol há a mim fazer eu vosso bem
e fazer a mim, senhor, mui gram mal?
  
Dizedes que mi havedes desamor
porque moro preto de vós, senhor,
15e que morre[re]des se m'eu nom for;
mais dizede, já que m'eu quero ir:
que prol há [a] mim guarir eu vós, senhor,
e matar mim, que moiro por guarir?
  
E vós guarredes sem mi, mia senhor,
20e eu morrerei des que vos nom vir.


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Cancioneiros:

B 956, V 543

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Senhor fremosa do bom parecer,
pero que moiro querendo-vos bem,
se vos digo que muito mal mi vem
por vós, nom mi queredes rem dizer,
5       pero no mundo nom sei eu molher
       que tam bem diga o que dizer quer.
  
E, mia senhor fremosa, morrerei
com tanto mal como mi faz Amor
por vós, e se vo-lo digo, senhor,
10nom mi dizedes o que i farei;
       pero no mundo nom sei eu molher
       que tam bem diga o que dizer quer.
  
[E] estas coitas grandes que sofr'i
por vós, se mi vos en venho queixar,
15come se nom soubéssedes falar,
nom mi dizedes o que faça i;
       pero no mundo nom sei eu molher
       que tam bem diga o que dizer quer.
  
E pois nom fala quem bem diz que quer,
20como falará bem quem nom souber?


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Cancioneiros:

B 957, V 544

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Que de bem mi ora podia fazer
Deus se quisess' (e nom lhi cust'ar rem):
contar-mi os dias que nom passei bem
e dar-mi outro[s] tantos a meu prazer
5com mia senhor; ca, se Deus mi perdom,
os dias que viv'hom'a seu prazer
       dev'a contar que viv'e outros nom.
  
E mia vida non'a devo chamar
vida, mais mort', a que eu mi passei
10sem mia senhor, ca nunca led'andei
e nom foi vida, mais foi gram pesar;
por en sabem quantos no mundo som:
os dias que viv'home sem pesar
       dev'a contar que viv'e outros nom.
  
15E os dias que me sem mia senhor
Deus fez viver, passe[i]-os eu tam mal
que nunca vi prazer de mim nem d'al
e esta vida foi tam sem sabor;
e quen'a julgar quiser com razom,
20os dias que viv'hom'a seu sabor
       dev'a contar que viv'e outros nom.


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Cancioneiros:

B 958, V 545

Descrição:

Cantiga de Amor

Mestria

Nom que[i]ra Deus em conto receber
os dias que vivo sem mia senhor,
porque os vivo mui sem meu sabor;
mailos dias que m'Ele fez[er] viver
5u a veja e lhi possa falar
esses Lhi quer'eu em conto filhar,
ca nom é vida viver sem prazer.
  
E se m'Ele fez[er] algũa sazom
viver com ela quanto mi aprouguer,
10esses dias mi cont'El, se quiser,
que eu com ela viver, e mais nom;
de mia vida mais nom vos contarei,
dos dias que a meu pesar passei,
ca nom foi vida, mais foi perdiçom.
  
15Ca nom é vida viver hom'assi
com'hoj'eu vivo u mia senhor nom é,
ca par de morte m'é, per boa fé;
e se mi Deus contar quanto vevi,
nom cont'os dias que nom passei bem,
20mais El, que os dias em poder tem,
dê-mi outros tantos por quanto[s] perdi.
  
Ca [a] El dias nunca minguará[m]
e eu serei bem andant', e serám
cobrado'los meus dias que perdi.


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Cancioneiros:

B 959, V 546

Descrição:

Cantiga de Amor

Mestria

A mia senhor, que me tem em poder
e que eu sei mais doutra rem amar,
sempr'eu farei quanto m'ela mandar
a meu grado, que eu possa fazer;
5mais nom lhi posso fazer ũa rem:
quando mi diz que lhi nom que[i]ra bem,
ca o nom posso comigo poer.
  
Ca se eu migo podesse poer,
se Deus mi valha, de a nom amar,
10ela nom havia que mi rogar,
ca eu rogad'era de o fazer;
mais nom posso querer mal a quem
Nostro Senhor quis dar tam muito bem
como lh'El deu, e tam bom parecer.
  
15Sa bondad'e seu bom parecer
mi faz a mim mia senhor tant'amar
e seu bom prez e seu mui bom falar,
que nom poss'eu, per rem, i al fazer;
mais ponha ela consigo ũa rem:
20de nunca jamais mi parecer bem,
porrei mig'eu de lhi bem nom querer.


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Cancioneiros:

B 960, V 547

Descrição:

Cantiga de Género incerto

Refrão

A por que perço o dormir
e ando mui namorado
vejo-a daqui partir
e fic'eu desemparado;
5a mui gram prazer se vai
a Crexent', em sua mua baia;
       vestida d'um prés de Cambrai,
       Deus! que bem lh'está manto e saia.
  
A morrer houvi por en
10tanto a vi bem talhada,
que parecia mui bem
em sua sela dourada;
as sueiras som d'ensai
e os arções [som] de faia;
15       vestida d'um prés de Cambrai
       Deus! que bem lh'está manto e saia.
  
Se a pudess'eu filhar
terria-m'en por bem andante
e nos braços a levar
20na coma do rocim, deante,
per caminho de Lampai
passar Minh'e Doir'e Gaia;
       vestida d'um prés de Cambrai
       Deus! que bem lh'está manto e saia.
  
25Se a pudess'alongar
quatro légoas de Crecente
e nos braço'la filhar,
apertá-la fortemente,
nom lhi valria dizer "ai"
30nem chamar Deus nem Sant'Ovaia.
       vestida d'um prés de Cambrai
       Deus! que bem lh'está manto e saia.


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Cancioneiros:

B 961, V 548

Descrição:

Cantiga de Amor

Mestria

Houvi agora de mia prol gram sabor
mia senhor, e conse[l]hou-me por en
que me partisse de lhi querer bem,
e dixi-lh'eu: – Fremosa mia senhor,
5mui bem me conselhades vós, mais nom
poss'eu migo nem com meu coraçom,
que somos ambos em poder d'Amor.
  
E disse-m'ela: – Por Nostro Senhor,
quitade-vos, amigo, de mal sem
10e nom amedes quem vos nom quer bem.
E dixi-lh'eu: – Per bõa fé, senhor,
se eu podesse comigo poder,
bem vos podia tod'esso fazer,
mais nom posso migo nem com Amor.
  
15E disse-m'ela: – Tenh'eu por melhor
de vos quitardes, ca prol nom vos tem
d'amardes mim, pois mi nom é en bem.
E dixi-lh'eu: – Per bõa fé, senhor,
se eu podess', (o que nom poderei),
20poder comig'e com Amor, bem sei
que vos faria de grad'ess'amor.


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Cancioneiros:

B 962, V 549

Descrição:

Cantiga de Género incerto

Mestria

Algum bem mi deve ced'a fazer
Deus, e fará-mi-o quando Lh'aprouguer:
sempr'ando led'e quem mi falar quer
em pesar, nom lho posso padecer,
5mais fuj'ant'el e nom lho quer'oir;
des i ar hei gram sabor de guarir
com quem sei que quer falar em prazer.
  
Ca todos andam cuidando em haver
e outra rem nom querem cuidar já,
10e morrem ced'e fica tod'acá;
mais esto migo nom podem põer
- que trob'e cant'e cuido sempr'em bem,
e tenh'amiga que faz mui bom sem,
[e] pod'o tempo passar em prazer.
  
15Nostro Senhor, que há mui gram poder,
é sempre ledo no seu coraçom,
e som mui ledos quantos com El som;
por en faz mal, quant'é meu conhocer,
o que trist'é, que sempre cuida mal,
20ca um pobre ledo mil tanto val
ca rico triste em que nom há prazer.


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Cancioneiros:

B 963, V 550

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Tôdalas cousas eu vejo partir
do mund', em como soíam seer,
e vej'as gentes partir de fazer
bem que soíam, tal tempo nos vem!
5Mais nom se pod'o coraçom partir
       do meu amigo de mi querer bem.
  
Pero que home part'o coraçom
das cousas que ama, per bõa fé,
e parte-s'home da terra ond'é,
10e parte-s'home d'u gran[de] prol tem,
nom se pode parti'lo coraçom
       do meu amigo de mi querer bem.
  
Tôdalas cousas eu vejo mudar,
mudam-s'os tempos e muda-s'o al,
15muda-s'a gente em fazer bem ou mal,
mudam-s'os ventos e tod'outra rem,
mais nom se pod'o coraçom mudar
       do meu amigo de mi querer bem.


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Cancioneiros:

B 964, V 551

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

Dizem-mi a mi quantos amigos hei
que nunca perderei coita d'amor,
se m'eu nom alongar de mia senhor;
e digo-lhis eu como vos direi:
5       - Par Deus, sempr'eu alongado vevi
       dela e do seu bem, e nom vos perdi
  
coita d'amor. Pero dizem que bem
farei eu mia fazenda de viver
longi dela, que mi nom quer valer;
10mais de tal guisa lhis dig'eu por en:
       - Par Deus, sempr'eu alongado vevi
       dela e do seu bem, e nom vos perdi
  
coita d'amor. Pero dizem que nom
poss'eu viver se me nom alongar
15de tal senhor, que se nom quer nembrar
de mim; mais digo-lhis eu log'entom:
       - Par Deus, sempr'eu alongado vevi
       dela e do seu bem, e nom vos perdi
  
coita d'amor; nem alhur nem ali
20nom lhi guarrei, ca muito lhi guari.


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Cancioneiros:

B 965, V 552

Descrição:

Cantiga de Amor

Refrão

A mia senhor, que eu sei muit'amar,
punhei sempre do seu amor gaar
e non'o houvi; mais, a meu cuidar,
nom fui eu i de sem nem sabedor
5por quanto lh'eu fui amor demandar,
       ca nunca vi molher mais sem amor.
  
E des que a vi sempr'a muit'amei,
e sempre lhi seu amor demandei,
e non'o houvi nen'o haverei;
10mais, se cent'anos for seu servidor,
nunca lh'eu já amor demandarei,
       ca nunca vi molher mais sem amor.


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Cancioneiros:

B 966, V 553

Descrição:

Cantiga de Escárnio e Maldizer

Mestria

Meu senhor rei de Castela,
venho-me vos querelar:
eu amei ũa donzela,
por que m'ouvistes trobar;
5e com quem se foi casar,
por quant'eu dela bem dixi,
quer-m'ora por en matar.
  
Fiador pera dereito
lhi quix perante vós dar;
10el houve de mim despeito
e mandou-me desafiar;
nom lh'eu sei alá morar,
venh'a vós que m'emparedes
ca nom hei quem m'emparar.
  
15Senhor, por Santa Maria,
mandad'ante vós chamar
ela e mim algum dia,
mandade-nos razõar:
se s'ela de mim queixar
20de nulha rem que dissesse,
em sa prisom quer'entrar.
  
Se mi justiça nom val
ante rei tam justiceiro,
ir-m'-ei ao de Portugal.


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Cancioneiros:

B 967, V 554

Descrição:

Cantiga de Pastorela

Mestria

Pelo souto de Crexente
ũa pastor vi andar,
muit'alongada da gente,
alçando voz a cantar,
5apertando-se na saia,
quando saía la raia
do sol, nas ribas do Sar.
  
E as aves que voavam,
quando saía l'alvor,
10todas d'amores cantavam
pelos ramos d'arredor;
mais nom sei tal qu'i 'stevesse,
que em al cuidar podesse
senom todo em amor.
  
15Ali 'stivi eu mui quedo,
quis falar e nom ousei,
empero dix'a gram medo:
- Mia senhor, falar-vos-ei
um pouco, se mi ascuitardes,
20e ir-m'hei quando mandardes,
mais aqui nom [e]starei.
  
- Senhor, por Santa Maria,
nom estedes mais aqui,
mais ide-vos vossa via,
25faredes mesura i;
ca os que aqui chegarem,
pois que vos aqui acharem,
bem dirám que mais houv'i.


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Cancioneiros:

V 594
(C 1004)

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Dizem, amigo, que outra senhor
queredes vós sem meu grado filhar
por mi fazerdes com ela pesar,
mais, a la fé, nom hei end'eu pavor,
5       ca já todas sabem que sodes meu
       e nẽũa nom vos querrá por seu.
  
Faríades-mi vós de coraçom
este pesar, mais nom sei hoj'eu quem
me vos filhass', e já vos nom val rem,
10ai meu amigo, vedes por que nom:
       ca já todas sabem que sodes meu
       e nẽũa nom vos querrá por seu.
  
E quem vos a vós esto conselhou
mui bem sei [eu] ca vos conselhou mal
15e com tod'esso já vos rem nom val,
ai meu amigo, tardi vos nembrou:
       ca já todas sabem que sodes meu
       e nẽũa nom vos querrá por seu.
  
Cofonda Deus a que filhar o meu
20amig', e mim, se eu filhar o seu.


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Cancioneiros:

V 595

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

O que soía, mia filha, morrer
por vós, dizem que já nom morr'assi,
e moir'eu, filha, porque o oí;
mais, se o queredes veer morrer,
5       dizede que morre por vós alguém
       e veredes home morrer por en.
  
O que morria, mia filha, por vós
como nunca vi morrer por molher
home no mundo, já morrer nom quer,
10mais, se queredes que moira por vós,
       dizede que morre por vós alguém
       e veredes home morrer por en.
  
O que morria, mia filha, d'amor
por vós nom morre nem quer i cuidar,
15e moir'end'eu, mia filha, com pesar,
mais, se queredes que moira d'amor,
       dizede que morre por vós alguém
       e veredes home morrer por en.
  
Ca, se souber que por vós morr'alguém,
20morrerá, filha, querendo-vos bem.


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Cancioneiros:

V 596

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Par Deus, mia madr', o que mi gram bem quer
diz que deseja comig'a falar
mais doutra rem que homem pod'osmar;
e ũa vez, se a vós aprouguer,
5       fale migo, pois end'há tal prazer,
       e saberemo'lo que quer dizer.
  
De falar migo nom perç'eu bom prez,
ca de sa prol i rem nom falarei,
e el dirá e eu ascuitarei;
10e ante que moira, já ũa vez
       fale migo, pois end'há tal prazer,
       e saberemo'lo que quer dizer.
  
Se vos prouguer, venha falar aqui
conmig', ai madre, pois en sabor há,
15e direi-vos pois quanto m'el dirá;
e ũa vez, ante que moira 'ssi,
       fale migo, pois end'há tal prazer,
       e saberemo'lo que quer dizer.
  
Quiçá quer-mi ora tal cousa dizer
20que lha poss'eu sem meu dano fazer.


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Cancioneiros:

V 597

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

O meu amigo novas sabe já
daquestas cortes que s'ora fará[m],
ricas e nobres dizem que serám,
e meu amigo bem sei que fará
5       um cantar em que dirá de mim bem;
       ou o fará ou já o feito tem.
  
Loar-mi-á muito e chamar-mi-á senhor,
ca muit'há gram sabor de me loar;
10a muitas donas fará gram pesar,
mais el fará, com'é mui trobador,
       um cantar em que dirá de mim bem;
       ou o fará ou já o feito tem.
  
En'aquestas cortes que faz el-rei
15loará mim e meu [bom] parecer
e dirá quanto bem poder dizer
de mim, amigas, e fará, bem sei,
       um cantar em que dirá de mim bem;
       ou o fará ou já o feito tem.
  
Ca o virom cuidar, e sei eu bem
que nom cuidava já em outra rem.


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Cancioneiros:

V 598

Descrição:

Cantiga de Amigo

Mestria

Amigo, quando me levou
mia madr', [a] meu pesar, daqui,
nom soubestes novas de mi,
e por maravilha tenho
5por nom saberdes quando vou
nem saberdes quando venho.
  
Pero que vos [ch]amades meu
amigo, nom soubestes rem
quando me levarom daquém,
10e maravilho-me ende
por nom saberdes quando m'eu
venh'ou quando vou daquende.
  
Catei por vós quand'a partir-
-m'houve daqui e pero nom
15vos vi nem veestes entom,
e mui queixosa vos ando
por nom saberdes quando m'ir
quer'ou se verrei já quando.
  
E por amigo nom tenho
20o que nom sabe quando vou
nem sabe quando me venho.


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Cancioneiros:

V 599

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Ai mia filha, por Deus, guisade vós
que vos veja [e]sse fustam trager
voss'amig'e, tod'a vosso poder,
veja-vos bem com el estar em cós;
5       ca, se vos vir, sei eu ca morrerá
       por vós, filha, ca mui bem vos está.
  
Se vo'lo fustam estevesse mal,
nom vos mandaria ir ant'os seus
olhos, mais guisade cedo, por Deus,
10que vos veja, nom façades end'al;
       ca, se vos vir, sei eu ca morrerá
       por vós, filha, ca mui bem vos está.
  
E como quer que vos el[e] seja
sanhudo, pois que vo'lo fustam vir,
15haverá gram sabor de vos cousir,
e guisade vós como vos veja;
       ca, se vos vir, sei eu ca morrerá
       por vós, filha, ca mui bem vos está.
  


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Cancioneiros:

V 600

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

O meu amigo nom pod'haver bem
de mi, amiga, vedes por que nom:
el nom mi o diz, assi Deus mi perdom,
nem lho dig'eu, e assi nos avém:
5       el com pavor nom mi o ousa 'mentar;
       eu, amiga, non'o posso rogar.
  
E gram sazom há já, per bõa fé,
que el [o] meu bem podera haver
e jamais nunca mi o ousou dizer
10e o preito direi-vos eu com'é:
       el com pavor nom mi o ousa 'mentar;
       eu, amiga, non'o posso rogar.
  
E gram temp'há que lh[o] eu entendi,
ca mi o disserom, mais houvi pavor
15de mi pesar e, par Nostro Senhor,
prouguera-m'end'e [e]stamos assi:
       el com pavor nom mi o ousa 'mentar;
       eu, amiga, non'o posso rogar.
  
E o preito guisad'em se chegar
20era, mais nom há quen'o começar.


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Cancioneiros:

V 601

Descrição:

Cantiga de Escárnio e Maldizer

Mestria

Os que dizem que veem bem e mal
[e]nas aves e d'agoirar pre[i]t'ham,
querem corvo seestro quando vam
algur entrar; e digo-lhis eu al:
5que Iésu Cristo nom me perdom
se ant'eu nom queria um capom
que um gram corvo carnaçal.
  
E o que diz que é mui sabedor
d'agoir'e d'aves, quand'algur quer ir,
10quer corvo seestro sempr'ao partir;
e por en dig'eu a Nostro Senhor
que El[e] me dê, cada u chegar,
capom cevado pera meu jantar
e dê o corvo ao agoirador.
  
15Ca eu sei bem as aves conhoscer
e com patela gorda mais me praz
que com bulhafre, voutre, nem viaraz,
que me nom pode[m] bem nem mal fazer;
e o agoirador torpe que diz
20que mais val o corvo que a perdiz,
nunca o Deus leixe melhor escolher.


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Cancioneiros:

B 1012, V 602

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Meu amigo, vós morredes
porque vos nom leixam migo
falar e moir'eu, amigo,
por vós e, fé que devedes,
5       algum conselh'i hajamos
       ante que assi moiramos.
  
Ambos morremos, sem falha,
por quanto nós nom podemos
falar e, pois que morremos,
10amigo, se Deus vos valha,
       algum conselh'i hajamos
       ante que assi moiramos.
  
De mia madr'hei gram queixume
porque nos anda guardando
15e morremos i cuidando;
ai meu amig'e meu lume,
       algum conselh'i hajamos
       ante que assi moiramos.
  
E por que o nom guisamos,
20pois nós tant'o desejamos?


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Cancioneiros:

B 1013, V 603

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Entend'eu, amiga, per boa fé,
que havedes queixum', u al nom há,
de voss'amigo, que aqui está,
e el de vós, [e] nom sei por que é,
5       mais quero-vos ora bem conselhar:
       fazed'i ambos o que eu mandar.
  
E, amiga, de pram, u nom jaz al,
este preito deve-se de fazer,
ca vos vejo del gram queixum'haver
10e el de vós, e tenho que é mal;
       mais quero-vos ora bem conselhar:
       fazed'i ambos o que eu mandar.
  
Sanha d'amigos é, nom será bem,
e sei que faredes end'o melhor,
15pero vejo-vos haver desamor
del, amiga, e esto nom convém;
       mais quero-vos ora bem conselhar:
       fazed'i ambos o que eu mandar.
  
E mal [l]h'en venh'a quem nom outorgar
20antre vós ambos o que eu mandar.


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Cancioneiros:

B 1014, V 604

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

O meu amigo, que xi m'assanhou
e que nom quer já comigo falar,
se cuidou el que o foss'eu rogar,
se lh'eu souber que o assi cuidou,
5       farei que em tal coita o tenha
       por mi amor que rogar me venha.
  
E pois que o meu amigo souber
que lh'esto farei, nom atenderá
que o eu rogue, mais logo verrá
10el rogar a mi e, se end'al fezer,
       farei que em tal coita o tenha
       por mi amor que rogar me venha.
  
Nem haverá meu amigo poder
de nulha sanha filhar contra mi
15mais que eu nom quiser que seja assi,
ca, se doutra guisa quiser fazer,
       farei que em tal coita o tenha
       por mi amor que rogar me venha.
  


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Cancioneiros:

B 1015, V 605

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

O voss'amig'há de vós gram pavor,
ca sab'el que vos fazem entender
que foi, amiga, de vós mal dizer;
mais voss'amigo diz end'o melhor:
5       que, de quanto disse de vós e diz,
vó'lo julgad'assi come senhor;
       ca diz que nom quer i outro juiz.
  
Queixades-vos del, mais, se Deus quiser,
saberedes, a pouca de sazom,
10que nunca disse de vós se bem nom,
nem dirá, mais diz quant'i há mester:
       que, de quanto disse de vós e diz,
vó'lo julgade como vos prouguer;
       ca diz que nom quer i outro juiz.
  
15Rogou-m'el muito que vos jurass'eu
que nunca disse de vós senom bem,
nen'o dirá, e ar diz outra rem,
e nom há mais que diga, cuido-m'eu:
       que, de quanto disse de vós e diz,
20vós julgad'i o voss[o] e o seu;
       ca diz que nom quer i outro juiz.
  
Filhad'o seu preito, como [el] diz,
sobre vós, e conselho-vo-lo eu,
e nom ponhades i outro juiz.


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Cancioneiros:

B 1016, V 606

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão, Dialogada

- Meu amigo, quero-vos preguntar.
- Preguntade, senhor, ca m'[é] en bem.
- Nom vos há mester de mi rem negar.
- Nunca vos eu, senhor, negarei rem.
5       - Tantos cantares por que fazedes?
       - Senhor, ca nunca mi escaecedes.
  
- Preguntar-vos quero, per bõa fé.
- Preguntade, ca hei en gram sabor.
- Nom mi neguedes rem, pois assi é.
10- Nunca vos rem negarei, mia senhor.
       - Tantos cantares por que fazedes?
       - Senhor, ca nunca mi escaecedes.
  
- Nom vos pês de qual pregunta fez[er].
- Nom, senhor, ante vo-lo gracirei.
15- Nem m'ar neguedes o que vos disser.
- Nunca vos eu, senhor, rem negarei.
       - Tantos cantares por que fazedes?
       - Senhor, ca nunca mi escaecedes.
  
- [E] este bem por mi o fazedes?
20- Por vós, mia senhor, que o valedes.


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Cancioneiros:

B 1017, V 607

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Par Deus, amigo, nom sei eu que é,
mais muit'há já que vos vejo partir
de trobar por mi e de me servir,
mais ũa destas é, per bõa fé:
5       ou é per mi, que vos nom faço bem,
       ou é sinal de morte que vos vem.
  
Mui gram temp'há, e tenho que é mal,
que vos nom oí já cantar fazer,
nem loar-mi, nem meu bom parecer,
10mais ũa destas é, u nom ja[z] al:
       ou é per mi, que vos nom faço bem,
       ou é sinal de morte que vos vem.
  
Já m'eu do tempo acordar nom sei
que vos oísse fazer um cantar,
15como soíades, por me loar,
mais ũa destas é que vos direi:
       ou é per mi, que vos nom faço bem,
       ou é sinal de morte que vos vem.
  
Se é per mi, que vos nom faço bem,
20dizede-mi-o, e já quê farei en.


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Cancioneiros:

B 1018, V 608

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Par Deus, mia madr', houvestes gram prazer
quando se foi meu amigo daqui,
e ora vem, e praz en muit'a mi;
mais ũas novas vos quero dizer:
5       se vos pesar, sofrede-o mui bem,
       ca 'ssi fij'eu, quando s'el foi daquém.
  
Ca fostes vós mui leda do meu mal
quando s'el foi, e querrei-vos eu já
mal por end', e dizem-mi que verrá
10mui ced', e quero-vos eu dizer al:
       se vos pesar, sofrede o mui bem,
       ca 'ssi fij'eu, quando s'el foi daquém.


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Cancioneiros:

B 1019, V 609

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Que mui leda que eu mia madre vi
quando se foi meu amigo daqui,
e eu nunca fui leda nem dormi,
       amiga, depois que s'el foi daquém;
5       e ora já dizem-mi del que vem,
       e mal grad'haja mia madre por en.
  
Ela foi [mui] leda, poilo viu ir,
e eu mui triste, poilo vi partir
de mi, ca nunca mais pudi dormir,
10       amiga, depois que s'el foi daquém;
       e ora já dizem-mi del que vem
       e mal grad'haja mia madre por en.
  
De[s] quando s'el foi daqui a [e]l- rei,
foi mia madre mui led[a], e[u] o sei,
15[e] eu fui [mui] triste sempr'e chorei,
       amiga, depois que s'el foi daquém;
       e ora já dizem-mi del que vem
       e mal grad'haja mia madre por en.


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Cancioneiros:

B 1020, V 610

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Vai-s', amiga, meu amigo daqui
triste, ca diz que nunca lhi fiz bem,
mais, se o virdes ou ante vós vem,
dizede-lhi ca lhi dig'eu assi:
5       que se venha mui ced'e, se veer
       cedo, que será como Deus quiser.
  
Per bõa fé, nom lhi poss'eu fazer
bem, e vai triste no seu coraçom,
mais, se o virdes, se Deus vos perdom,
10dizede-lhi que lhi mand'eu dizer
       que se venha mui ced'e, se veer
       cedo, que será como Deus quiser.
  
Queixa-s'el e diz que sempre foi meu,
e diz gram dereito, per bõa fé,
15e nom lhi fiz bem, e tem que mal é,
mais dizede-lhi vós que lhi dig'eu
       que se venha mui ced'e, se veer
       cedo, que será como Deus quiser.
  
E nom se queixe, ca nom lh'há mester,
20e filhe o bem quando lho Deus der.


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Cancioneiros:

B 1021, V 611

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Queixos'andades, amigo, d'amor
e de mi, que vos nom posso fazer
bem, ca nom hei, sem meu dan', en poder,
e por en guise-mi-o Nostro Senhor
5       que vos faça eu bem em guisa tal
       que seja vosso bem e nom meu mal.
  
Queixades-vos que sempre fostes meu,
amig', e vos leixo por mi morrer,
mais dizede-mi como vos valer
10possa sem meu dan', e guisá-lo eu
       que vos faça eu bem em guisa tal
       que seja vosso bem e nom meu mal.
  
Sõo guardada como outra molher
nom foi, amigo, nem há de seer,
15ca vos nom ous'a falar nem veer,
e por en guise-mi-o Deus, se quiser,
       que vos faça eu bem em guisa tal
       que seja vosso bem e nom meu mal.


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Cancioneiros:

B 1022, V 612

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

A meu amigo mandad'enviei
a Toled', amiga, per boa fé,
e mui bem creo que já co el é;
preguntad', e gradecer-vo-lo-ei,
5       em quantos dias poderá chegar
       aqui de Toledo quem bem andar.
  
Ca do mandadeiro sei eu mui bem
que, depois que lh'o mandado disser,
que se verrá mais cedo que poder;
10e, amiga, sabede vós d'alguém
       em quantos dias poderá chegar
       aqui de Toledo quem bem andar.
  
E sempre catam estes olhos meus
per u eu cuido que há de viir
15o mandadeir', e moiro por oír
novas del, e preguntade, por Deus,
       em quantos dias poderá chegar
       aqui de Toledo quem bem andar.


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Cancioneiros:

B 1023=1049, V 613=639

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Queredes ir, meu amigo, eu o sei,
buscar outro conselh'e nom o meu;
porque sabedes que vos desej'eu,
queredes-vos ir morar com el-rei,
5       mais id'ora quanto quiserdes ir,
       ca pois a mi havedes a viir.
  
Ides-vos vós e fico eu aqui
que vos hei sempre muit'a desejar;
e vós queredes com el-rei morar
10porque cuidades mais valer per i;
       mais id'ora quanto quiserdes ir,
       ca pois a mi havedes a viir.
  
Sabor havedes, a vosso dizer,
de me servir, amig', e pero nom
15leixades d'ir al-rei por tal razom;
nom podedes el-rei e mim haver,
       mais id'ora quanto quiserdes ir,
       ca pois a mi havedes a viir.
  
E, amigo, querede-lo oir?
20Nom podedes dous senhores servir
que ambos hajam rem que vos gracir.


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Cancioneiros:

B 1024, V 614

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Diz meu amigo tanto bem de mi
quant'el mais pod'e de meu parecer,
e os que sabem que o diz assi
têm que hei eu que lhi gradecer;
5       em quant'el diz, nom lhi gradesc'eu rem,
       ca mi sei eu que mi paresco bem.
  
Diz-mi fremosa e diz-mi senhor,
e fremosa mi dirá quem me vir,
e têm que mi faz mui grand'amor
10e que [eu] hei muito que lhi gracir;
       em quant'el diz, nom lhi gradesc'eu rem,
       ca mi sei eu que mi paresco bem.
  
Diz muito bem de mim em seu trobar
com gram dereit', e al vos en direi:
15têm bem quantos me lh'oem loar
que eu muito que [lhi] gradecer hei;
       em quant'el diz, nom lhi gradesc'eu rem,
       ca mi sei eu que mi paresco bem.
  
Ca, se eu nom parecesse mui bem,
20de quant'el diz non'[o] diria rem.


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Cancioneiros:

B 1025, V 615

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão, Dialogada

- Ai mia filha, de vós saber quer'eu
porque fezestes quanto vos mandou
voss'amigo, que vos nom ar falou.
- Par Deus, mia madre, direi-vo-lo eu:
5       cuid[ava-m]'eu melhor haver per i
       e semelha-mi que nom est assi.
  
- Por que fezestes, se Deus vos dê bem,
filha, quanto vos el vẽo rogar?
Ca des entom nom vos ar quis falar.
10- Direi-vo-l[o] eu, se Deus mi dê bem:
       cuid[ava-m]'eu melhor haver per i
       e semelha-mi que nom est assi.
  
- Por que fezestes, se Deus vos perdom,
filha, quanto vos el vẽo dizer?
15Ca des entom nom vos ar quis veer.
- Direi-vo-l[o] eu, se Deus mi perdom:
       cuid[ava-m]'eu melhor haver per i
       e semelha-mi que nom est assi.
  
[E] bom dia naceu, com'eu oí,
20que[m] se doutro castiga e nom de si.


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Cancioneiros:

B 1026, V 616

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Quand'eu fui um dia vosco falar,
meu amigo, figi-o eu por bem,
e enfengestes-vos de mim por en;
mais, se vos eu outra vez ar falar,
5       logo vós dizede[s] ca fezestes
       comigo quanto fazer quisestes.
  
Ca, meu amigo, falei eu ũa vez
convosco, por vos de morte guarir,
e fostes-vos vós de mim enfingir;
10mais, se vos eu [ar] falar outra vez,
       logo vós dizede[s] ca fezestes
       comigo quanto fazer quisestes.
  
Ca mui bem sei eu que nom fezestes
o meio de quanto vós dissestes.


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Cancioneiros:

B 1027, V 617

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Amigo, veestes-m'um di'aqui
rogar dum preit'e nom vos fig'en rem
porque cuidava que nom era bem;
mais, pois vos já tant'aficades i,
5       fazê-lo quer'e nom farei end'al,
       mais vós guardade mi e vós de mal.
  
Vós dizedes que o que meu mal for
nom queredes, e bem pode seer,
pero nom quix vosso rogo fazer;
10mais, pois end'havedes tam gram sabor,
       fazê-lo quer'e nom farei end'al,
       mais vós guardade-mi e vós de mal.
  
Bem sabedes como falámos nós
e me vós rogastes o que m'eu sei
15e non'o fiz, mais com pavor que hei
de perder eu, amigo, contra vós,
       fazê-lo quer'e nom farei end'al,
       mais vós guardade-mi e vós de mal.
  
E se vós fordes amigo leal,
20guardaredes vossa senhor de mal.


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Cancioneiros:

B 1028, V 618

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Nom vos sabedes, amigo, guardar
de vos saberem, por vosso mal sem,
como me vós sabedes muit'amar,
nem a gram coita que vos por mi vem;
5       e quero-vos end'eu desenganar:
       se souberem que mi queredes bem,
       quite sodes de nunca mi falar.
  
Per nulha rem nom me posso quitar
de falar vosc'e sempre me temi
10de mi o saberem, ca m'ham d'alongar
de vós, se o souberem, des ali;
       e quero-vos end'eu desenganar:
       se souberem que mi queredes bem,
       quite sodes de nunca mi falar.
  
15Do que me guarda tal é seu cuidar:
que amades, amig', outra senhor;
ca, se a verdade poder osmar,
nunca ver[r]edes jamais u eu for;
       e quero-vos end'eu desenganar:
20       se souberem que mi queredes bem,
       quite sodes de nunca mi falar.
  
E se havedes gram coita d'amor,
havê-la-edes per mi [mui] maior,
ca de longi mi vos farám catar.


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Cancioneiros:

B 1029, V 619

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Nom hei eu poder do meu amigo
partir, amigas, de mi querer bem,
e, pero m'eu queixo, prol nom mi tem,
e quando lh'eu rogo muit'e digo
5       que se parta de mi tal bem querer,
       tanto mi val come nom lho dizer.
  
Se mi quer falar, digo-lh'eu logo
que mi nom fale, ca mi vem gram mal
de sa fala, mais mui pouco mi val;
10e quando lh'eu digo muit'e rogo
       que se parta de mi tal bem querer,
       tanto mi val come nom lho dizer.
  
Sempre mi pesa com sa companha,
porque hei medo de mi crecer prez
15com el, com'outra vegada já fez;
e, pero lhi dig'em mui gram sanha
       que se parta de mi tal bem querer,
       tanto mi val come nom lho dizer.
  


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Cancioneiros:

B 1030, V 620

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Mia madre, pois [a]tal é vosso sem
que eu que[i]ra mal a quem mi quer bem
e me vós roguedes muito por en,
dized'ora, por Deus que pod'e val,
5pois eu mal quiser a quem mi quer bem,
       se querrei bem a quem mi quiser mal.
  
Dizedes-mi que, se eu mal quiser
a meu amigo, que mi gram bem quer,
que faredes sempre quant'eu disser,
10mais venh'or'a que mi digades al:
pois hei de querer mal a quem mi bem quer
       se querrei bem a quem mi quiser mal.
  
Muito mi será grave de sofrer
d'haver quem mi quer bem mal a querer,
15e vós, madre, mandades-mi-o fazer,
mais faço-vos ũa pregunt'atal:
pois quem mi quer bem hei mal a querer,
       se querrei bem a quem mi quiser mal.
  
Se assi for, por mi podem dizer
20que eu fui a que semeou o sal.


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Cancioneiros:

B 1031, V 621

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Diz meu amigo que, u nom jaz al,
morre, ca nom pod'haver bem de mi,
e queixa-se-me muito e diz assi:
que o mat'eu e que faço mui mal;
5       mais onde tem el que o mato eu?
       Se el morr'é por lh'eu nom dar o meu.
  
Tem guisad'em muitas vezes morrer,
se el morrer cada que lh'eu nom der
do meu rem, senom quando m'eu quiser,
10e diz que o mato a mal fazer;
       mais onde tem el que o mato eu?
       Se el morr'é por lh'eu nom dar o meu.
  
Diz que tam muito é coitado d'amor
que rem de morte non'o tornará
15porque nom houve bem de mim nem há,
e diz-m'el: "[E] matades-me, senhor!";
       mais onde tem el que o mato eu?
       Se el morr'é por lh'eu nom dar o meu.
  
E assanha-xi-m'el, mais bem sei eu
20que a sanha toda é sobre lo meu.


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Cancioneiros:

B 1032, V 622

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Voss'amigo quer-vos sas dõas dar,
amiga, e quero-vos dizer al:
dizem-mi que lhas queredes filhar;
e dized'ora, por Deus, ũa rem:
5se lhi filhardes sas dõas ou al,
       que diredes por lhi nom fazer bem?
  
Vós nom seredes tam sem conhocer,
se lhi filhardes nulha rem do seu,
que lhi nom hajades bem a fazer;
10e venh'ora preguntar-vos por en:
se lhi filhardes nulha rem do seu,
       que diredes por lhi nom fazer bem?
  
El punhará muit', e fará razom,
de lhas filhardes, quando vo-las der,
15e vós ou lhas filharedes ou nom;
e dized'ora qual é vosso sem:
se lhi filhardes quanto vos el der,
       que diredes por lhi nom fazer bem?
  
Ou bem filhade quanto vos el der
20e fazede bem quanto x'el quiser,
  
ou nom filhedes, com sem, nulha rem
nem lhi façades nunca nẽum bem.


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Cancioneiros:

B 1033, V 623

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

O meu amigo, forçado d'amor,
pois agora comigo quer viver
ũa sazom, se o puder fazer,
nom dórmia já mentre comigo for,
5       ca daquel tempo que migo guarir
       atanto perderá quanto dormir.
  
E quem bem quer [o] seu tempo passar
u é com sa senhor, nom dorme rem;
e meu amigo, pois pera mi vem,
10nom dórmia já mentre migo morar,
       ca daquel tempo que migo guarir
       atanto perderá quanto dormir.
  
E, se lh'aprouguer de dormir alá
u el é, prazer-mi-á, per bõa fé,
15pero dormir tempo perdud[o] é,
mais per meu grad'aqui nom dormirá,
       ca daquel tempo que migo guarir
       atanto perderá quanto dormir.
  
E, depois que s[e] el de mim partir,
20tanto dórmia quanto quiser dormir.


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Cancioneiros:

B 1034, V 624

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Quer meu amigo de mi um preito
que el já muitas vezes quisera:
que lhi faça bem; e já temp'era,
mas, como quer que seja meu feito,
5       farei-lh'eu bem, par Santa Maria,
       mais nom tam cedo com'el querria.
  
E digam-lhi por mi que nom tenha
que lho vou eu por mal demorando,
ca el anda-se de mi queixando,
10mais, como quer que depois [mi] venha,
       farei-lh'eu bem, par Santa Maria,
       mais nom tam cedo com'el querria.
  
El é por mi atam namorado
e meu amor o traj'assi louco
15que se nom pod'atender um pouco,
mais, tanto que eu haja guisado,
       farei-lh'eu bem, par Santa Maria,
       mais nom tam cedo com'el querria.
  
E, como quer que fosse, el querria
20haver já bem de mim todavia.
  
E bem sei del que nom cataria
o que m'end'a mim depois verria.


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Cancioneiros:

B 1035, V 625

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Diz, amiga, o que mi gram bem quer
que nunca mais mi rem demandará,
sol que lh'ouça quanto dizer quiser,
e, mentre viver, que me servirá;
5       e vedes ora com'é sabedor:
       que, pois que lh'eu tod'este bem fezer,
       log'el querrá que lhi faça melhor.
  
Mui bem cuid'eu que com mentira vem,
pero jura que mi nom quer mentir,
10mais diz que fale conmig', e por en,
mentre viver, nom mi quer al pedir;
       e vedes ora com'é sabedor:
       que, pois que lh'eu tod'este bem fezer,
       log'el querrá que lhi faça melhor.
  
15Gram pavor hei nom me queira enganar,
pero diz el que nom quer al de mim
senom falar mig', e mais demandar,
mentre viver, nom [mi] quer des ali;
       e vedes ora com'é sabedor:
20       que, pois que lh'eu tod'este bem fezer,
       log'el querrá que lhi faça melhor.
  
E esto será mentr'o mundo for:
quant'home mais houver ou acabar,
tanto d'haver mais haverá sabor.
  
25Mais id', amiga, vós, por meu amor,
conmig'ali u m'el quiser falar,
ca mal mi venha, se lh'eu soa for.


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Cancioneiros:

B 1036, V 626

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Que mui de grad'eu faria
prazer ao meu amigo,
amiga, bem vo-lo digo,
mais log[o] em aquel dia
5       nom leixará el, amiga,
       nulh'home a que o nom diga.
  
Faria-lho mui de grado,
porque sei que me deseja,
mais, se guisar u me veja
10e lhi fezer seu mandado,
       nom leixará el, amiga,
       nulh'hom'a que o nom diga.
  
Tam coitado por mi anda
que nom há paz nem mesura;
15pero se eu, per ventura,
fezer todo quant'el manda,
       nom leixará el, amiga,
       nulh'hom'a que o nom diga.
  
Dizedor é de nemiga
20e dirá-o log', amiga.


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Cancioneiros:

B 1037, V 627

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Vedes, amigo, ond'hei gram pesar:
sei muitas donas que sabem amar
seus amigos e soem-lhis falar
e nom lho sabem, assi lhis avém;
5e nós sol que o queiramos provar,
       log'é sabud'e nom sei eu per quem.
  
Tal dona sei eu, quando quer veer
seu amigo, a que sabe bem querer,
que lho nom podem per rem entender
10o[s] que cuidam que a guarda[m] mui bem;
e nós sol que o queiramos fazer,
       log'é sabud'e nom sei eu per quem.
  
Com'eu querria, nom se guis'assi:
falar vosco, que morredes por mi,
15com'outras donas falam, e des i
nunca lhis mais podem entender rem;
e nós [sol] ante que cheguemos i,
       log'é sabud'e nom sei eu per quem.
  
Coita lhi venha qual ora a nós vem
20per quem nos a nós tod'este mal vem.


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Cancioneiros:

B 1038, V 628

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Morreredes, se vos nom fezer bem,
por mim, amig', e nom sei que vos i
faça, pero muitas vezes cuid'i,
e deste preito vedes que mi avém:
5       é-mi mui grave de vos bem fazer
       e mui grav'é de vos leixar morrer.
  
Rem nom vos pode de morte guardar,
e sei bem que morr[er]edes por mi,
se nom houverdes algum bem de mim;
10e quant'eu hei em tod'est'a cuidar:
       é-mi mui grave de vos bem fazer
       e mui grav'é de vos leixar morrer.
  
Se vos nom fezer bem, por mi Amor
vos matará, bem sei que será assi,
15mais bem vos jur'e digo-vos assi,
se Deus mi leix'en fazer o melhor:
       é-mi mui grave de vos bem fazer
       e mui grav'é de vos leixar morrer.
  
E rog'a Deus, que há end'o poder,
20que El me leix'end'o melhor fazer.


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Cancioneiros:

B 1039, V 629

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Alguém vos diss', amig', e sei-o eu,
por mi miscrar convosco, que falei
com outr'homem, mais nunca o cuidei,
e, meu amig', e direi-vo-l[o] eu:
5       de mentira nom me poss'eu guardar,
       mais guardar-m'-ei de vos fazer pesar.
  
Alguém sabe que mi queredes bem
e pesa-lh'end'e nom pod'al fazer
senom que mi quer mentira põer;
10[e] meu amig'e meu lum'e meu bem
       de mentira nom me poss'eu guardar,
       mais guardar-m'-ei de vos fazer pesar.
  
E bem sei de quem tam gram sabor há
de mentir e nom teme Deus nem al,
15que mi assaca tal mentira e al,
[e], meu amig', e vedes quant'i há:
       de mentira nom me poss'eu guardar,
       mais guardar-m'-ei de vos fazer pesar.
  
De fazer mentira sei-m'eu guardar,
20mais nom de quem me mal quer assacar.


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Cancioneiros:

B 1040, V 630

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Amigas, o que mi quer bem
dizem-mi ora muitos que vem,
       pero non'o posso creer,
       ca tal sabor hei de o veer
5       que o nom posso creer.
  
O que eu amo mais ca mim
dizem que cedo será aqui,
       pero non'o posso creer,
       ca tal sabor hei de o veer
10       que o nom posso creer.
  
O que se foi daqui muit'há
dizem-mi que cedo verrá,
       pero non'o posso creer,
       ca tal sabor hei de o veer
15       que o nom posso creer.
  
E nunca mi o farám creer
se mi o nom fezerem veer.


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Cancioneiros:

B 1041, V 631

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão, Dialogada

- O voss'amigo que s'a cas d'el-rei
foi, amiga, mui cedo vos verrá,
e partide as dõas que vos dará
- Amiga, verdade bem vos direi:
5       fará-mi Deus bem, se mi o adusser,
       e sas dõas dé-as a quem quiser.
  
- Disserom-mi ora, se Deus mi perdom,
que vos trage dõas de Portugal,
e, amiga, non'as partades mal.
10- Direi-vos, amiga, meu coraçom:
       fará-mi Deus bem, se mi o adusser,
       e sas dõas dé-as a quem quiser.
  
- Dizem, amiga, que nom vem o meu
amigo, mailo vosso cedo vem,
15e partid'as dõas, que trage, bem.
- Direi-vos, amiga, o que dig'eu:
       fará-mi Deus bem, se mi o adusser,
       e sas dõas dé-as a quem quiser.
  
E bem sei eu [que], des que el veer,
20haverei dõas e quant'al quiser.


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Cancioneiros:

B 1042, V 632

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Vai meu amigo com el-rei morar
e nom mi o disse nem lh[o] outorguei,
e faz mal sem de mi faz[er] pesar;
mais eu perça bom parecer que hei,
5       se nunca lh'el-rei tanto bem fezer
       quanto lh'eu farei, quando mi quiser.
  
E [el] quer muito com el-rei viver
e [a] mia sanha non'a tem em rem;
e el-rei pode quanto quer poder,
10mas mal mi venha onde vem o bem,
       se nunca lh'el-rei tanto bem fezer
       quanto lh'eu farei, quando mi quiser.
  
E el punhou muit[o sempr'] em me servir
e a [e]l-rei nunca serviço fez,
15por end'el-rei nom há que lhi gracir;
mais eu perça bom parecer e bom prez,
       se nunca lh'el-rei tanto bem fezer
       quanto lh'eu farei, quando mi quiser.
  
Ca mais [lhi] valrá se lh'eu [bem] quiser,
20que quanto bem lh'el-rei fazer poder.


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Cancioneiros:

B 1043, V 633

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Amigo, queredes-vos ir,
e bem sei eu que mi averrá:
enmentre morardes alá,
a quantos end'eu vir viir,
5       a todos eu preguntarei
       como vos vai em cas d'el-rei.
  
Nom vos poderia dizer
quant'hei de vos irdes [pesar],
mais a quantos eu vir chegar
10d'u ides com el-rei viver,
       a todos eu preguntarei
       como vos vai em cas d'el-rei.
  
Coitada ficarei d'amor
atá que mi vos Deus adusser,
15mais a quantos eu já souber
que veerem d'u el-rei for,
       a todos eu preguntarei
       como vos vai em cas d'el-rei.
  
E, se disserem 'Bem', loarei
20Deus, e graci-lo-ei a 'l-rei.


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Cancioneiros:

B 1044/1048, V 634/638

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Foi-s'o meu amigo a cas d'el-rei
e, amigas, com grand'amor que lh'hei,
quand'el veer, já eu morta serei,
mais nom lhe digam que morri assi,
5       ca, se souber com'eu por el morri,
       será mui pouca sa vida des i.
  
Per nulha rem nom me posso guardar
que nom moira ced'e com gram pesar,
e, amigas, quand'el aqui chegar,
10nom sábia per vós qual mort'eu prendi,
       ca, se souber com'eu por el morri,
       será mui pouca sa vida des i.
  
Eu morrerei cedo, se Deus quiser,
e, amigas, quand'el aqui veer,
15desmesura dirá quem lhi disser
qual mort'eu filhei des que o nom vi,
       ca, se souber com'eu por el morri,
       será mui pouca sa vida des i.
  
Já nom posso de morte guarecer,
20mais, quando s'el tornar por me veer,
nom lhi digam como m'el fez morrer
ante tempo, porque se foi daqui,
       ca, se souber com'eu por el morri,
       será mui pouca sa vida des i.
  


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Cancioneiros:

B 1045, V 635

Descrição:

Cantiga de Amigo

Fragmento

Amei-vos sempr', amigo, e fiz-vos lealdade:
se preguntar quiserdes em vossa puridade,
saberedes, amigo, que vos digo verdade;
ou, se falar houverdes com algum maldizente
5e vos quiser, amigo, faz[er d]'al entendente,
dizede-lhi que mente,
dizede-lhi que mente.


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Cancioneiros:

B 1046, V 636

Descrição:

Cantiga de Amigo

Mestria

Meu amig'e meu bem e meu amor,
disserom-vos que me virom falar
com outr'home por vos fazer pesar,
e por en rog'eu a Nostro Senhor
5que confonda quem vo-lo foi dizer,
e vós, se o assi fostes creer,
e mim, se end'eu fui merecedor.
  
Já vos disserom por mi que falei
com outr'hom'e que vos nom tiv'em rem,
10e, se o fiz, nunca mi venha bem;
mais rog'a Deus sempr'e rogá-Lo-ei
que confonda quem vo-lo diss'assi,
e vós, se tam gram mentira de mim
crevestes, e mim, se o eu cuidei.
  
15Sei que vos disserom, per bõa fé,
que falei com outr'hom', e nom foi al
senom que vo-lo disserom por mal;
mais rog'a Deus, que [e]no ceo sé,
que confonda quem vos atal razom
20diss', e vós, se a crevestes entom,
e que confonda mim, se verdad'é.
  
E confonda quem há tam gram sabor
d'antre mim e vós meter desamor
- ca [o] maior amor do mund[o] é.


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Cancioneiros:

B 1047, V 637

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

A que mi a mi meu amigo filhou
mui sem meu grad', e nom me tev'em rem
que me servi'e mi queria bem,
e nom mi o disse nem mi o preguntou,
5       mal [l]hi será, quando lho eu filhar
       mui sem seu grad', e non'a preguntar.
  
E, se m'ela mui gram torto fez i,
Deus me leixe dereito dela haver,
ca o levou de mim sem meu prazer;
10e ora tem que o levará assi,
       mal [l]hi será, quando lh'o eu filhar
       mui sem seu grad', e non'a preguntar.
  
E bem sei eu dela que [vos] dirá
que nom fiz eu por el quant'ela fez;
15mais quiçai mi o fezera outra vez,
e, pero tem bem que o haverá,
       mal [l]hi será, quando lh'o eu filhar
       mui sem seu grad', e non'a preguntar.
  
Entom veeredes molher andar
20pós mim chorand', e nom lho querrei dar.


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Cancioneiros:

B 1048, V 638?

Descrição:

Cantiga de Amigo



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Cancioneiros:

B 1050, V 640

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Ir-vos queredes, e nom hei poder,
par Deus, amigo, de vos en tolher,
e, se ficardes, vos quero dizer,
meu amig', o que vos por en farei:
5os dias que vós a vosso prazer
       nom passastes, eu vo-los cobrarei.
  
Se vos fordes, sofrerei a maior
coita que sofreu molher por senhor;
e, se ficardes polo meu amor,
10direi-vo'lo que vos por en farei:
os dias que vós a vosso sabor
       nom passastes, eu vo-los cobrarei.
  
Ides-vos e teendes-m'em desdém
e fico eu mui coitada por en;
15e ficade por mi, ca vos convém,
e direi-vos que vos por en farei:
os dias que vós nom passastes bem,
       ai meu amigo, eu vo-los cobrarei.


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Cancioneiros:

B 1051, V 641

Descrição:

Cantiga de Amigo

Refrão

Ir-vos queredes, amigo,
daqui, por me fazer pesar,
e, pois vos queredes quitar
daqui, vedes que vos digo:
5       quitade bem o coraçom
       de mim, e ide-vos entom.
  
E pois vos ides, sabiades
que nunca maior pesar vi,
e, pois vos queredes daqui
10partir, vedes que façades:
       quitade bem o coraçom
       de mim, e ide-vos entom.


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Cancioneiros:

B 1052, V 642

Descrição:

Tenção

Fragmento

Rubrica:

Esta tençom fez Joam Airas de Santiago a um que havia nome Rui To[n]so Cantom e se pôs nome Rui Martĩĩz, e o outro respondeu-lhi

- Rui Martĩĩz, pois que ést[e] assi
que vós já mais [nom] quisestes viver
em Leon e nos veestes veer,
dized'agora vós um preit'a mi,
5Rui Martĩĩz, assi Deus vos perdom.
[...]


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Cancioneiros:

B 1461, V 1071

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Refrão

Pero Garcia me disse
que mia senhor com el visse;
e dixe-lh'eu, que nom oísse:
       - Ai Pero Garcia,
5       gram med'hei de Dona Maria,
       que nos mataria!
  
Disse-m'el: - Aventuremos
os corpos e alá entremos.
Dixe-lh'eu: - Nõn'o faremos.
10       Ai Pero Garcia,
       gram med'hei de Dona Maria,
       que nos mataria!
  
Disse-m'el: - Entremos, ante
que Dona Maria jante.
15Dix'eu: - Ide vós deante.
       Ai Pero Garcia,
       gram med'hei de Dona Maria,
       que nos mataria!
  
Mal conhoscedes Dona Maria,
20       ai Pero Garcia!


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Cancioneiros:

B 1462, V 1072

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Refrão

Quando chamam Joan'Airas, reedor, bem cuid'eu logo,
per boa fé, que mi chamam; mais a Nostro Senhor rogo
       que atal Demo o tome,
       per que me tolhem o nome.
  
5Vêm Joam'Airas chamando per aqui todo o dia,
e eu vou, quand'o chamam; mais rog'eu a Santa Maria
       que atal Demo o tome,
       per que me tolhem o nome.


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Cancioneiros:

B 1463, V 1073

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Mestria

Dizem que ora chegou Dom Beeito,
muit[o] alegre, pera sa molher,
com sas merchandias de Mompiler;
mais dizer-vos quer'ora um preito:
5já Deus nom me leixe entrar sobre mar
se, polo custo, queria filhar
o mercado que el [há] algur feito.
  
E por um destes nossos miradoiros
veo aqui, bem guisado, esta vez,
10com sas merchandias que alá fez;
mais dizem que houve maos agoiros
e ar dizem que mercou atam mal,
que nunca end'haverá seu cadal,
ca se lhi danarom mui mal os coiros.


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Cancioneiros:

B 1464, V 1074

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Refrão

Dom Beeito, home duro,
foi beijar pelo oscuro
       a mia senhor.
  
Come home aventurado,
5foi beijar pelo furado
       a mia senhor.
  
Vedes que gram desventura:
beijou pela fendedura
       a mia senhor.
  
10Vedes que mui grand'abaco:
foi beijar polo buraco
       a mia senhor.


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Cancioneiros:

B 1465, V 1075

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Refrão

U, com Dom Beeito, aos preitos veerom,
cuspirom as donas e assi disserom:
       - Talhou Dom Beeito
       aqui o feeito.
  
5E pois que houveram já feita sa voda,
cuspiram as donas, e diz Dona Toda:
       - Talhou Dom Beeito
       aqui o feeito.
  
Todas se da casa com coita saíam
10e iam cuspindo todas e diziam:
       - Talhou Dom Beeito
       aqui o feeito.


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Cancioneiros:

B 1466, V 1076

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Mestria

Ai Justiça, mal fazedes, que nom
queredes ora dereito filhar
de Mor da Cana, porque foi matar
Joan'Airas, ca fez mui sem razom;
5mais se dereito queredes fazer,
ela sô el devedes a meter,
ca o manda o Livro de Leon.
  
Ca lhi queria gram bem, e des i
nunca lhi chamava senom senhor;
10e quando lh'el queria mui milhor,
foi-o ela logo matar ali;
mais, Justiça, pois tam gram torto fez,
metede-a já sô el ũa vez,
ca o manda o dereito assi.
  
15E quando mais Joan'Airas cuidou
que houvesse de Mor da Cana bem,
foi-o ela logo matar por en,
tanto que el em seu poder entrou;
mais, Justiça, pois que assi é já,
20metam-na sô el, e padecerá
a que o a mui gram torto matou.
  
E quen'os ambos vir jazer, dirá:
- Beeito seja aquel que o julgou!


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Cancioneiros:

B 1467, V 1077
(C 1467)

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Refrão

Ũa dona, nom dig'eu qual,
nom aguirou ogano mal:
polas oitavas de Natal,
ia por sa missa oir,
5e [houv'] um corvo carnaçal,
       e nom quis da casa sair.
  
A dona, mui de coraçom,
oíra sa missa entom,
e foi por oír o sarmom,
10e vedes que lho foi partir:
houve sig'um corv'a carom,
       e nom quis da casa sair.
  
A dona disse: - Que será?
E i o clérig'está já
15revestid'e maldizer-m'-á
se me na igreja nom vir.
E diss'o corvo: – Quá, cá;
       e nom quis da casa sair.
  
Nunca taes agoiros vi
20des aquel dia em que naci
com'aquest'ano houv'aqui;
e ela quis provar de s'ir
e houv'um corvo sobre si
       e nom quis da casa sair.


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Cancioneiros:

B 1468, V 1078

Descrição:

Cantiga de Escárnio e maldizer

Mestria

Dom Pero Núnez era em Cornado
e ia-s'a Santiag'albergar;
e o agüiro sol el bem catar,
ca muitas vezes l'houv'afaçanhado;
5e indo da cas[a] ao celeiro,
houv'um corvo viaraz e faceiro,
de que Dom Pero nom foi rem pagado.
  
E pois lo el houve muito catado,
diz: - Deste corvo nom posso escapar
10que del nom haja 'scarnho a tomar,
com gram perda do que hei gaanhado,
ou da maior parte do que houver,
per ventur', ou do corpo ou da molher,
segund'eu hei o agoiro provado.
  
15E tornou-se contra seu gasalhado
e diz: - Amiga, muit'hei gram pesar,
ca me nom posso de dano guardar
deste corvo, que vejo tam chegado
a nossa casa, pois filha perfia
20e corvej'aqui sempr'o mais do dia
e diz de noute "Crás, crás", [a]fumado!


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Cancioneiros:

B 1551

Descrição:

Tenção

Mestria

- Joan'Airas, ora vej'eu que há
Deus mui gram sabor de vos destroir,
pois vós tal cousa fostes comedir:
que, de quantas molheres no mund'há,
5de todas vós gram mal fostes dizer,
cativ', e nom soubestes entender
o mui gram mal que vos sempr'en verrá.
  
- Joam Vaásquiz, sempr'eu direi já
de molheres moito mal, u as vir;
10ca, porque eu foi end'ũa servir,
sempre mi gram mal quis e querrá já;
por gram bem que lh'eu sabia querer,
casou-s'ora, por mi pesar fazer,
com quen'a nunca amou nem amará.
  
15- Joan'Airas, nom tenh'eu por razom
d'as molheres todas caerem mal
por end'ũa sóo, que a vós fal,
ca Deu'lo sabe que é sem razom;
por end'a vós ũa tolher o sem
20e dizerdes das outras mal por en,
errades vós, assi Deus mi perdom.
  
- Joam Vaásquiz, todas taes som
que, pois virem que nom amades al
senom elas, logo vos faram tal
25qual fez a mim ũa; e todas som
aleivosas; e quem lhis desto bem
disser, atal prazer veja de quem
[quer] que mais amar no seu coraçom.
  
- Joan'Airas, vós perdestes o sem,
30ca enas molheres sempr'houve bem
e haverá já, mais pera vós nom.
  
- Joam Vaásquiz, nom dizedes rem,
ca todos se queixam delas por en,
senom vós, que filhastes por en dom.