Martim Moxa


O gram prazer e gram viç'em cuidar,
que sempr'houvi, no bem de mia senhor,
mi a fazem já tam muito desejar
que moir'e nom perço coitas d'amor;
5pero avém que algũa sazom
ard'e mi afog'e moiro porque nom
 senç'u me dol, nem sei em que travar.
  
 E por esto nom leixei, pois, [d']amar
e servir bem e fazê'lo milhor;
 10ca sempr'Amor per bem se quer levar,
e o pequeno e o grande e o maior,
quaes el quer, eno seu poder som;
pois assi é, semelha-mi razom
de a servir e seu bem aguardar.
  
15Ai, Deus! tal bem quen'o podess'haver
de tal sen[h]or qual mim em poder tem!
Pero que tom'em cuidar i prazer,
 cuidar me tolh'o dormir e o sem:
 ca nom poss'end'o coraçom partir,
20ca mi a faz sempr'ant'os meus olhos ir
cada u vou e, u a vi, veer.
  
Mais tanto sei: se podesse seer
se viss'ela o meu coraçom tam bem
com'el ela, dever-s'-ia doer
25del e de mim, poilo viss'; e por en
am'eu e trob'e punh'ena servir:
que entenda, pois meu cantar oir,
o que nom posso nem lh'ouso a dizer.
  
 E nom dev'homem seu cor encobrir
30a quem sabe que o pode guarir:
demais u lh'outro nom pode valer.



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Nota geral:

Mais uma cantiga de amor retoricamente muito elaborada, como é habitual em Martim Moxa. O trovador começa por dizer que o prazer e a satisfação que tem em pensar continuamente na sua senhora atiçam o desejo que tem dela - mas, fazem ao mesmo tempo com que, por vezes, "arda e se afogue e morra porque não sente onde lhe dói, nem sabe a que se agarrar" (o que é uma notável descrição do seu estado de paixão).
Nem por isso deixa de a amar e de a servir, como diz na 2ª estrofe, porque o Amor a todos obriga a lutar para alcançar o que se deseja. E quem lhe dera a ele alcançar os favores da sua senhora!, como exclama na 3ª estrofe. Não consegue, entretanto, deixar de pensar nela, mesmo que isso lhe tire o sono e a razão: pois, em qualquer lugar onde vá, o seu coração traz-lhe continuamente a sua imagem, e faz com que a veja em todo o lado, tal como a viu da primeira vez.
Pudesse ela ver também o seu coração, como ele a vê a ela, diz na 4ª estrofe, e decerto deveria mostrar alguma compaixão. Mas é por isso que faz trovas: para que ela entenda, ao ouvir o seu cantar, aquilo que não lhe ousa dizer. Porque, como conclui na finda, um homem não deve esconder o que sente daquela que o pode socorrer, sobretudo se mais ninguém o pode fazer.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Amor
Mestria
Cobras doblas
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 891, V 475

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 891

Cancioneiro da Vaticana - V 475


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas