João Soares Coelho


Com'hoj'eu vivo no mundo coitado!
 Nas graves coitas que hei de sofrer,
nom poderia outr'home viver;
nem eu fezera, temp'há i passado;
5mais quando cuid'em qual mia senhor vi,
em tanto viv'e em tanto vivi,
e tenho m'en das coitas por pagado.
  
Empero quand'eu, eno meu cuidado,
cuido nas coitas que me faz haver,
10cuido mia mort'e querria morrer
e cuid'em como fui mal dia nado;
mais quand'ar cuid'em qual mia senhor vi,
de quantas coitas por ela sofri,
muito m'en tenho por aventurado.
  
15E em seu bem per mi seer loado
nom há mester d'eu ende mais dizer,
 ca Deus la fez[o] qual melhor fazer
soub'eno mund'; e bem maravilhado
será, quem vir a senhor que eu vi,
20pelo seu bem; e bem dirá per mi
que bem dev'end'a Deus a dar bom grado
  
de quantas coitas por ela sofri,
- se Deus mi a mostre como a já vi
seendo com sa madre em um estrado!



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Nota geral:

Pensando no mal que sofre pela sua senhora, o trovador crê que nenhum outro homem o poderia suportar, e nem mesmo ele, tempos atrás. Mas quando pensa nela, tal como a viu no primeiro momento, e pensa na vida que tem levado, dá o seu sofrimento por bem empregado. Esta mesma dualidade reaparece na 2ª estrofe: por um lado, um sofrimento que o faz desejar a morte, por outro a imagem da sua senhora, uma imagem que tudo apaga e o faz mesmo considerar-se feliz. Na 3ª estrofe, o trovador faz o seu (tradicional) elogio, concluindo que todos os que a conhecerem acharão que ele deve agradecer a Deus os males que sofre por tal senhora.
Para os dois últimos versos da finda, onde expressa o desejo de a poder ver, deixa o trovador a maior originalidade da cantiga (e um dos finais mais originais de todas as cantigas de amor que nos chegaram): o quadro familiar e muito concreto em que a imagina, sentada com sua mãe num estrado (como dizemos na nota ao último verso, nas casas nobres medievais, sobretudo as ibéricas, as damas sentavam-se habitualmente num estrado, uma superfície que se elevava um pouco do chão, sobre almofadas).



Nota geral


Descrição

Cantiga de Amor
Mestria
Cobras uníssonas
Palavra(s)-rima: (v. 5 de cada estrofe)
vi
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

A 170, B 321

Cancioneiro da Ajuda - A 170

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 321


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas