Pedro, conde de Barcelos

Rubrica:

    

Esta cantiga de cima foi feita a um Meestre d'ordim de cavalaria, porque havia sa barragãã e fazia seus [filhos] em ela ante que fosse Meestre; e depois havia ũa tenda em Lisboa, em que tragia mui grande haver a gaanho; e aquela sa barregãã, quando lhi algũus dinheiros vinham da terra da Ordem e que Meestre i nom era, enviava-os aaquela tenda, pera gaanharem com eles pera seus filhos; e depois tirarom ende os dinheiros da tenda e derom-nos em outras praças pera gaanharem com eles, e ficou a tenda desfeita; e nom leixou por en o Meestre depois a [barre]gãã.


Um cavaleiro havia
ũa tenda mui fremosa
 que, cada que nela siia,
assaz lh'era saborosa;
5e um dia, pela sesta,
u estava bem armada
de cada part', espeçada
foi toda pela Meestra.
  
Na tenda nom ficou pano
10nem cordas nem guarnimento
que toda nom foss'a dano,
pelo apoderamento
da Maestra, que, tirando
 foi tanto pelo esteo,
15que por esto, com'eu creo,
se foi toda [e]speçando.
  
A corda foi em pedaços
 e o mais do al perdudo;
mais ficarom-lhi dous maços
 20[a] par do esteo merjudo,
e a Maestra metuda
na grand'estaca, jazendo;
e foi-s'a tenda perdendo
assi como é perduda.
  
25Per míngua de bom meestre
pereceo tod'a tenda;
que nunca se dela preste
pera dom nem pera venda,
 ca leixou, com mal recado,
30a Meestra tirar tanto
da tenda, que, já enquanto
viva, seerá posfaçado.



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Nota geral:

A longa rubrica que acompanha esta cantiga define as personagens e circunstâncias que lhe deram origem: um Mestre de uma Ordem de Cavalaria, com sua barregã tendeira e seus filhos, todos vivendo à custa dos dinheiros da Ordem, com os quais, aliás, especulavam. O negócio não lhes teria, no entanto, corrido da melhor forma, sendo finalmente obrigados a fechar a venda. Se esta história constitui a primeira leitura da cantiga, entenda-se, no entanto, o equívoco erótico que ela representa.
Embora, neste caso, o trovador não identifique nem o Mestre nem a Ordem, é muito possível que, como geralmente acontece nas sátiras que aludem à vida particular de personagens públicas, a cantiga tivesse uma dimensão política muito concreta. Investigações recentes, de Graça Videira Lopes1 e Cláudio Neto2, sugerem mesmo que o mestre em questão poderia eventualmente ser um dos irmãos Escacho, Pero ou Garcia Peres, que se sucederam à frente da Ordem de Santiago, o primeiro de 1319 a 1329, o segundo de 1329 a 1346. Ambos muito relacionados com a burguesia mercantil de Lisboa, eram também muito próximos de Afonso IV, numa fidelidade que vinha já dos tempos do conflito do então infante com seu pai, D. Dinis.

Referências

1 Lopes, Graça Videira (2012), "Algumas notas sobre a base de dados Cantigas Medievais Galego-Portuguesas", Medievalista [Em linha]. Nº12, (Julho - Dezembro 2012), Lisboa, IEM/FCSH-UNL.
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2 Neto, Cláudio (2012), As Ordens Militares na cultura escrita da Nobreza - 1240-1350. Representações nas cantigas de escárnio e de maldizer, FCSH-UNL, Dissertação de Mestrado.
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Nota geral


Descrição

Cantiga de Escárnio e maldizer
Mestria
Cobras singulares
(Saber mais)


Fontes manuscritas

V 1039

Cancioneiro da Vaticana - V 1039


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas