Pero da Ponte


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Se eu podesse desamar
a quem me sempre desamou
e podess'algum mal buscar
a quem me sempre mal buscou!
5Assi me vingaria eu,
       se eu pudesse coita dar
       a quem me sempre coita deu.
  
Mais sol nom poss'eu enganar
meu coraçom que m'enganou,
10per quanto mi fez desejar
a quem me nunca desejou.
 E por esto nom dórmio eu,
       porque nom poss'eu coita dar
       a quem me sempre coita deu.
  
15Mais rog'a Deus que desampar
a quem m'assi desamparou,
ou que podess'eu destorvar
a quem me sempre destorvou.
E logo dormiria eu,
20       se eu podesse coita dar
       a quem me sempre coita deu.
  
 Vel que ousass'en preguntar
a quem me nunca preguntou,
por que me fez em si cuidar,
25pois ela nunca em mi cuidou;
e por esto lazeiro eu:
       porque nom posso coita dar
       a quem me sempre coita deu.



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Nota geral:

Nesta bela cantiga da amor, ao mesmo tempo simples e retoricamente muito elaborada (com recurso a palavra-rima e múltiplas rimas derivadas, ou mozdobres), Pero da Ponte exprime o seu (impossível) desejo de vingar-se daquela que sempre o tratou mal, pagando-lhe na mesma moeda: deixando de a amar, procurando o seu mal e fazendo-a sofrer. Mas é este um desejo impossível, até porque a culpa é do seu próprio coração, que o fez desejar quem nunca o desejou. Sem poder dormir, só lhe resta pedir a Deus que desampare quem sempre o desamparou e lhe dê a ele a capacidade para a perturbar um pouco - e assim já dormiria. Ou pelo menos que lhe desse coragem para falar com ela.
A cantiga é também tematicamente original, na medida em que a tradicional resignação do trovador face ao sofrimento que lhe inflige a sua senhora, elemento tópico da cantiga de amor, é aqui declaradamente substituído pelo desejo de vingança, Note-se ainda a rara variação que ocorre, em estrofes alternadas, no 1º verso do refrão.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Amor
Refrão
Cobras uníssonas
Palavra(s)-rima: (v. 5 de cada estrofe)
eu
Dobre: (vv. 1 e 2 de cada estrofe)
desamar/ desamou (I), enganar/ enganou (II), desampar/ desamparou (III), preguntar/ preguntou (IV);
(vv. 3 e 4) buscar/ buscou (I), desejar /desejou (II), destrorvar/ destorvou
(Saber mais)


Fontes manuscritas

A 289, B 980, V 567

Cancioneiro da Ajuda - A 289

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 980

Cancioneiro da Vaticana - V 567


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Se eu pudesse desamar      versão audio disponível

Versão de Pedro Barroso

Pero da Ponte 

Versões de Tomás Borba

Se eu podesse desamar      versão audio disponível

Versão de Xurxo Romaní, Koichi Tanehashi