Pedro, conde de Barcelos


Que muito bem me fez Nostro Senhor
aquel dia em que m'El foi mostrar
ũa dona que fez melhor falar
de quantas fez e parecer melhor.
5E o dia em que mi a fez veer,
El quis assi que foss'em seu poder:
u me podia nunca mais bem dar.
  
Nom já em al, desto som sabedor,
se m'algum tempo quisera leixar
10ela servir e nõn'a ir matar;
mais, pois la matou, serei sofredor
sempre de coita enquant'eu viver;
ca, sol u cuido no seu parecer,
hei morte mais doutra rem desejar.
  
 15E pois eu nunca doutra rem sabor
 poss'atender pera me conortar,
mui bem posso com verdade jurar,
polos que dizem que ham mal d'amor,
que com verdad'o nom podem dizer:
20porque cuidand'i tomam gram prazer,
o que a mim nunca pode chegar.
  
Nem [e]sperança nunca poss'haver
com'outros ham, d'algum bem atender,
pois eu meu bem nunca posso cobrar.



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Nota geral:

O trovador inicia a sua cantiga com o reconhecimento da graça que Nosso Senhor lhe concedeu ao fazê-lo conhecer a sua senhora, cuja beleza e dom de palavra elogia. Mas, se desde esse dia ficou sob o seu domínio, o tempo que teve para a servir foi breve, pois Deus fê-la morrer logo em seguida (matou-a, diz). E é essa a razão para a sua dor profunda: recordando a sua imagem, o seu único desejo é também morrer. Uma dor sem consolo, bem diferente da dor dos que juram sofrer de amor, mas sentem prazer ao pensarem nas suas amadas. Uma dor sem esperança, já que esse ou qualquer outro prazer lhe está para sempre vedado.
Invocando uma razão concreta (e dramática) para o seu sofrimento, D. Pedro atualiza, de forma criativa e original, o registo tópico da cantiga de amor. Mas a sua cantiga é, para além disso, atravessada por um tom pessoal manifesto, a que será impossível não darmos um sentido biográfico, se tivermos em conta a morte da sua primeira mulher, D. Branca Peres, falecida por volta de 1307, pouco tempo após o casamento e muito jovem ainda.
De resto, este registo biográfico parece prolongar-se nas suas restantes cantigas de amor, que são três, e que parecem também seguir uma ordem cronológica, cada uma delas referindo uma etapa posterior a esta morte: na cantiga seguinte, a fase da indiferença e do negro pessimismo; logo depois a memória, já mais ou menos reconciliada, da mulher perdida, e a possibilidade de um novo amor; e, finalmente, na última composição, a plena e festiva assunção desse novo amor.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Amor
Mestria
Cobras uníssonas
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 608, V 210
(C 608)

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 608

Cancioneiro da Vaticana - V 210


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas