Nota geral: Cantiga de entendimento algo difícil, uma vez que, contrariamente ao que acontece na generalidade das cantigas satíricas, não sabemos exatamente a quem D. Dinis se dirige aqui. A referência ao "que revolve o caderno", feita na primeira estrofe, parece indicar que se trataria de um alto funcionário da Fazenda. Mas o refrão e o resto da cantiga parecem não se enquadrar nesta interpretação, já que aí o que é claramente aludido são os desbaratos feitos com a herança de um defunto. O problema da cantiga reside, pois, na identificação do defunto, que não é clara, e da relação deste com quem "se governa" com a sua herança. Atendendo a estes dados, é assim muito possível que a cantiga se relacione com um dos casos mais polémicos do reinado de D. Dinis, a complicada questão da herança dos Sousa, processo que, na sequência da morte, sem descendentes diretos, do poderoso conde D. Gonçalo Garcia de Sousa, ocorrida em 1285, esteve na origem das importantes inquirições mandadas fazer por D. Dinis (inicialmente, a pedido dos numerosos herdeiros, que não se entendiam)1. A dimensão e importância deste caso, e a sua perfeita adequação a esta cantiga de D. Dinis, levam-nos a pensar, pois, que, de forma genérica, serão esses herdeiros os visado pela composição (o que ajudaria, aliás, a explicar a ausência de qualquer nome concreto).
Referências 1 Krus, Luís (1994), "D. Dinis e a herança dos Sousas. O inquérito régio de 1287", in Estudos Medievais, Porto, nº 10, 1993, p. 119-158; reed. in Passado, memória e poder na sociedade medieval portuguesa. Estudos , Redondo, Patrimonia.
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