João Soares Somesso


Muito per dev'agradecer
(segund'agor'a meu cuidar)
a Deus, a quem faz bem querer
senhor com que pode falar
5em lhe sa coita descobrir.
Mais este bem, por nom mentir,
nom vo-lo quis El a mim dar!
  
Mais fez-m'atal senhor veer
de que m'houve sempr'a guardar,
10des que a vi, de m'entender
qual bem lhe quer', e de provar
se me queria consentir,
quam pouco quer, sol de mi oir
a coita que me faz levar.
  
 15Ca já toda, per nulha rem,
non'a poderia saber
per mim; nem ar sei hoj'eu quem
mi a toda podesse creer,
mentre me viss'assi andar
20viv'ontr'as gentes e falar
e d'atal coita nom morrer.
  
De qual, desejando seu bem,
me faz o seu amor sofrer,
ca de meor morreu já 'lguém;
25mais Deus me faz assi viver
em tam gram coita por mostrar
per mim ca xe pod'acabar
quant'El no mundo quer fazer.



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General note:

O trovador começa por dizer que muito deve agradecer a Deus aquele a quem Ele concedeu uma amada com quem pode falar e a quem pode confessar o seu amor. Não é o seu caso: Deus fê-lo amar uma senhora de quem sempre tentou esconder o que sente, tentando, ao mesmo tempo, perceber se ela estaria na disposição de ouvir as suas mágoas. Uma parte delas, aliás, porque nunca lhas poderia contar na totalidade; nem a ninguém, de resto, já que ninguém acreditaria, vendo-o a falar e a viver entre os demais, que ele sofre tanto. Uma vez que já viu outros morrerem por dores menores, se Deus o deixa continuar a viver é decerto para mostrar que não há nada Ele não possa fazer neste mundo.



General note


Description

Cantiga de Amor
Mestria
Cobras doblas
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Manuscript sources

A 26, B 119

Cancioneiro da Ajuda - A 26

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 119


Musical versions

Originals

Unknown

Contrafactum

Unknown

Modern Composition or Recreation

Unknown