João Garcia de Guilhade


Deus! Como se forom perder e matar
mui boas donzelas, quaes vos direi:
  foi[-se] Dordia Gil e foi[-se] Guiomar,
que prenderom ordim. Mais se foss'eu rei
5eu as mandaria por en[de] queimar
porque forom mund'e prez desemparar.
  
Nom metedes mentes em qual perdiçom
fezerom no mundo e se forom perder?!
  Com'outras arlotas, vivem na raçom,
10por muito de bem que poderom fazer.
Mais eu por alguém já mort'hei de prender,
que nom vej'e moiro por alguém veer.
  
Outra bõa dona que pelo reino há,
de bom prez e ric'e de bom parecer,
15se mi a Deus amostra, gram bem mi fará,
ca nunca prazer verei sen'a veer.
Que farei, coitado? Moiro por alguém
que nom vej'e moiro por veer alguém.



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General note:

Como acontece com várias composições que os cancioneiros nos transmitiram, o género desta cantiga não é muito claro. Não sendo exatamente uma cantiga de escárnio, é preciso, no entanto, chegar à sua terceira estrofe para podermos entrar no ambiente de uma cantiga de amor. Na verdade, as duas primeiras estrofes, cuja ligação com a terceira é, aliás, algo fluida, aludem apenas, e muito realisticamente, à entrada de duas donzelas, bem identificadas, para um convento. Quanto à bõa dona cantada na terceira estrofe, a sua relação com as anteriores não fácil de entender.
As donzelas em causa, cujos nomes podemos completar - trata-se de Dórdia Gil de Soverosa e de Guiomar Gil de Riba de Vizela - professaram no mosteiro de Arouca por volta de 1250. A ser assim, não é impossível que a cantiga se insira ainda, subtilmente, na turbulência nobiliárquica ocasionada pela deposição de Sancho II e a subida ao trono do seu irmão, Afonso III (1248). Na verdade, pertencendo as donzelas a famílias que se mantiveram fiéis a D. Sancho, e tudo indicando que a trajetória de Guilhade se processou na proximidade dos Sousa, partidários do novo rei, a sua cantiga poderá ser, na verdade, um irónico remoque às linhagens derrotadas (dando a entender que a entrada das donzelas na vida religiosa teria sido mais forçada por conveniências familiares do que por uma efetiva vocação?)



General note


Description

Género incerto
Mestria
Cobras singulares
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Manuscript sources

B 425, V 37

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 425

Cancioneiro da Vaticana - V 37


Musical versions

Originals

Unknown

Contrafactum

Unknown

Modern Composition or Recreation

Unknown