Rodrigo Anes Redondo


Dê'lo dia, ai amiga, que nos nós de vós partimos,
  fui-se nosco voss'amigo, e, per quanto nós oímos,
a[i] amiga, [que dizia], e, per quanto nós [del] vimos,
- queredes que vo-lo diga?
5Nunca tam leal amigo d'amiga vistes, amiga.
  
 U nos partimos chorando, vós e nós chorando vosco,
e el, mui sen'o seu grado, houve-s'entom d'ir connosco,
[muito lhi vos assanhastes]; mais, per quant'eu del conhosco,
sempre serei de seu bando,
10que, enquanto vós chorastes, nunca el quedou chorando.
  
 Come vós des i chorava, e ia-s'apartar sóo,
 e catava-m'el os panos, que eu tragia com dóo;
 mais, pero o preguntavam por que chorava, negó-o;
mais a mim non'o negava,
15e por esto som certãa, 'miga, que por vós chorava.



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General note:

Uma amiga conta à donzela as reações do seu amigo aquando de uma triste partida, na qual, tanto quanto percebemos, ela o acompanhou, juntamente com outros. Considerando-o o melhor e mais leal dos amigos, conta-lhe, pois, que, se a donzela chorou à despedida, o seu amigo também não parou de chorar. E afastou-se até dos que seguiam na viagem, tentando esconder a sua mágoa (embora não a ela),
Esta bela cantiga de amigo de Rodrigues Anes Redondo, de tema pouco habitual, coloca-nos alguns problemas, que não são fáceis de resolver. Por um lado, e do ponto de vista da sua compreensão geral, faltam-nos os dados contextuais que nos permitam entender cabalmente as circunstâncias e as personagens que põe em cena, e que aqui, até pelos pormenores inusitados que são referidos (nomeadamente a referência aos seus panos de dó, ou vestes de luto, feita pela voz feminina que canta) parecem claramente inserir-se num contexto biográfico preciso.
Por outro lado, a composição apresenta, no manuscrito, o que parecem ser algumas anomalias técnicas, sobretudo se tivermos em conta a disposição em versos curtos que aí encontramos, disposição que, desde a edição de D. Carolina Michaelis1 tem sido seguida por grande parte dos editores. No entanto, já Nobiling, que se debruçou posteriormente e com alguma demora sobre a composição2, tinha sugerido que se trataria, na verdade, de versos, na sua maioria, longos (e com cesura), apresentando, por sua parte, não uma, mas duas versões alternativas de leitura. Se bem que ambas sejam inteligentes, parece-nos que a segunda, embora introduza algumas modificações na lição do manuscritos, tem fortes probabilidades de se aproximar do que teria sido a versão original da composição. Não a seguindo totalmente à letra, é nela, pois, que baseamos a nossa leitura.

References

1 Vasconcelos, Carolina Michaëlis de (1990), Cancioneiro da Ajuda, vol. I, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda (reimpressão da edição de Halle, 1904) .

2 Nobiling, Oskar, "Acerca do texto e da interpretação do Cancioneiro da Ajuda" (1907), in As cantigas de D. Joan Garcia de Guilhade e estudos dispersos, ed. organizada por Yara Frateschi Vieira , Niterói, Editora da Universidade Federal Fluminense, 2010, pp. 213-215.



General note


Description

Cantiga de Amigo
Mestria
Cobras singulares
Dobre: (vv. 1 e 6 de cada estrofe)
amiga (I), chorando (II), chorava (III)
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Manuscript sources

B 332

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 332


Musical versions

Originals

Unknown

Contrafactum

Unknown

Modern Composition or Recreation

Unknown