Estêvão Peres Froião


Senhor, se o outro mundo passar
assi com'aqueste pass'e passei
 e com tal coita com'aqui levei
e lev', eno ifern'hei de morar
 5por vós, senhor, ca nom por outra rem:
 ca por vós perço Deus e sis'e sem,
 cando vos vejo dos olhos catar,
  
  atam muit'aposto, que nom há par;
e já me trabalhei de os cousir
10e comecei log'entom a ri[i]r
 e er filhei-me log'i a chorar,
com'homem desemparado d'Amor
e de vós; ai fremosa mia senhor,
nom sei com'esto podess'endurar!
  
15E já que vos no iferno falei,
senhor fremosa, e na coita daqui
que por vós hei, vedes quant'entend'i
e quanto daquesto mui bem sei:
que alá nom poderia haver tal
20coita qual sofro, tam descomunal,
 e sofr'e nunca por vós acorr'hei.
  
 Ca vedes, mia senhor, por que vo-lo hei:
porque fez Deus vosso corpo atal
em que nunca pod'homem saber mal,
25nem saberá; mais eu gram pavor hei
que vo-lo demandará por mim Deus,
 pois eu morrer, [ai] lume destes meus
olhos, que sempre mais que mim amei!



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Nota geral:

Dirigindo-se à sua senhora, o trovador começa por dizer que, se no outro mundo passar o que passa neste, é porque estará no inferno. Por ela, claro, que lhe faz esquecer Deus e perder o juízo e a razão quando a vê olhar com os seus olhos sem par, que o fazem rir e chorar ao mesmo tempo. Mas logo acrescenta que no inferno a sua dor seria até menor, pois a que presentemente sofre, sem socorro da parte dela, é "descomunal". E se ela está isenta de mal, o certo é que Deus também lhe pedirá contas por, com a sua beleza e perfeição, o fazer morrer desta maneira
Original e criativa, esta é também, infelizmente, a única composição que nos chegou deste trovador.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Amor
Mestria
Cobras singulares (rima a dobla)
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 923, V 511

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 923

Cancioneiro da Vaticana - V 511


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas