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  (linha 4)

João Soares Somesso


Muitas vezes em meu cuidar      ←
hei eu gram bem de mia senhor;       ←
 e quant'ali hei de sabor,      ←
  se mi ar torna pois em pesar,      ←
 5des que m'eu part'; e nulha rem      ←
me nom fica daquel gram bem,      ←
e nom me sei conselh'achar.      ←
  
Nem acharei, erg'em cuidar,      ←
conselh', enquant'eu vivo for,      ←
10ca 'ssi me tem forçad'Amor      ←
que me faz atal don'amar      ←
que me quer mui gram mal por en;      ←
e porque nom sab'amar, tem      ←
que nom pod'hom'Amor forçar.      ←
  
15Mais Amor há tam gram poder      ←
que forçar pode quem quiser;      ←
e pois que mia senhor nom quer       ←
 esto d'Amor per rem creer,      ←
jamais seu bem nom haverei,      ←
20senom assi como mi o hei:      ←
sempr'em cuidá'lo poss'haver!      ←
  
Ca Deus me deu tam gram poder       ←
 que, mentre m'eu guardar poder      ←
de fala d'hom'ou de molher,      ←
25que nom poss'este bem perder:      ←
ca sempr'em ela cuidarei,      ←
e sempr'em ela já terrei      ←
o coraçom, mentr'eu viver.      ←



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Nota geral:

O confronto entre a imaginação e a realidade é tema desta cantiga. A questão é resumida pelo trovador logo na 1ª estrofe: muitas vezes, em pensamento, imagina receber os favores da sua senhora; mas o gosto que então tem logo se transforma em tristeza, e nada lhe fica desse bem, nem sabe o que fazer. A única saída, como afirma na 2ª estrofe, é continuar a imaginar, pois o Amor força-o a amar uma senhora que o detesta por isso mesmo; e como ela não sabe amar, não acredita que o Amor tem tal poder. Ora, como prossegue na 3ª estrofe, o Amor tem efetivamente esse poder, e, não acreditando a dama em tal coisa, nunca poderá obter os seus favores senão em imaginação. Na última estrofe, ele explica melhor o que fará: enquanto se conseguir isolar, não falando com ninguém, pode imaginar à sua vontade e não perder esse bem. E assim se propõe continuar a pensar nela durante toda a vida.
Chamamos novamente a atenção para os divertidos comentários marginais (M) que um leitor do século XV escreveu nas margens do Cancioneiro da Ajuda.
Note-se ainda que, na cantiga seguinte, o trovador retoma e explica melhor aquilo em que cuida.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Amor
Mestria
Cobras doblas
Palavra(s)-rima: (v. 1 de cada estrofe)
cuidar (I, II), poder (III, IV)
(Saber mais)


Fontes manuscritas

A 16, B 109

Cancioneiro da Ajuda - A 16

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 109


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas