Antroponímia referida na cantiga:
  (linha 16)

Martim Soares

Rubrica:

     

Esta cantiga de cima fez Martim Soares a Roi Gomes de Briteiros, que era infançom [e se tornou] ric'homem, porque roussou Dona Elvira Anes, filha de Dom Joam Peres da Maia e de Dona Guiomar Meendes, filha del Conde Meendo.


Pois boas donas som desemparadas      ←
e nulho hom nõn'as quer defender,      ←
non'as quer'eu leixar estar quedadas,      ←
 mais quer'en duas per força prender,      ←
5ou três ou quatro, quaes m'eu escolher,      ←
pois nom ham já per quem sejam vengadas:      ←
 netas do Conde quer'eu cometer,      ←
que me seram mais pouc'acoomiadas!      ←
  
Netas de Conde, viúvas nem donzela,      ←
 10essa per rem nõn'a quer'eu leixar;      ←
nem lhe valrá se se chamar mesela,      ←
nem de carpir muito, nem de chorar,      ←
  ca me nom ham por en a desfiar      ←
 seu linhagem, nem deitar a Castela;      ←
15e veeredes meus filhos andar      ←
   netos de Gued'e partir em Sousela.      ←
  
Se eu netas de Conde, sem seu grado,      ←
tomar, em tanto com'eu vivo for,      ←
nunca por en serei desafiado,      ←
20nem pararei mia natura peior,      ←
ante farei meu linhagem melhor,      ←
o que end'é de Gueda, mais baixado;      ←
e veeredes, pois meu filho for      ←
neto de Gueda, com condes miscrado!      ←



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Nota geral:

Esta célebre cantiga de Martim Soares alude a um dos casos que mais brado deu na sua época, como a sua rubrica, aliás, indica: o rapto (e posterior casamento) de D. Elvira Anes da Maia, neta do Conde D. Mem Gonçalves de Sousa, o Sousão (valido de D. Sancho I e a principal figura da nobreza do seu tempo), por Rui Gomes de Briteiros (também trovador). À época um simples infanção, de origens modestas, com este casamento Rui Gomes inicia um percurso de ascensão social que o transformará gradualmente numa das figuras mais influentes do reino. Composta em forma de maldizer aposto, note-se que é a própria voz de Rui Gomes que ouvimos na cantiga, gabando-se da impunidade do seu ato.
Não sabemos exatamente de quando datará a composição de Martim Soares, mas certamente ela não será muito posterior ao dito rapto, que se terá dado por volta de 1230 (e que poderá ter sido, aliás, mais ou menos consentido). De qualquer forma, e para além do próprio rapto em si, poderemos dizer que o ponto de vista de Martim Soares, acentuando sobretudo a passividade dos que deveriam defender a honra da família, se alarga aqui a um retrato mais geral, o da "miséria moral e a decadência da alta nobreza de sangue", nas palavras Rodrigues Lapa1.
Quanto a Rui Gomes de Briteiros, a posição que irá tomar antes e durante a guerra civil portuguesa (1245-1248), de apoio incondiconal ao Conde de Bolonha, futuro Afonso III, permitiu-lhe ser regiamente recompensado por este monarca, que o faz rico-homem e mordomo-mor do reino. Símbolo da nova nobreza emergente, será a ele e à sua linhagem, aliás, que, posteriormente, D. Afonso Lopes de Baião (casado com outra neta do Conde, D. Mor Gonçalves de Sousa) dirigirá uma conhecida gesta de maldizer.

Referências

1 Lapa, Manuel Rodrigues (1970), Cantigas d´Escarnho e de Maldizer dos Cancioneiros Medievais Galego-Portugueses, 2ª Edição, Vigo, Editorial Galaxia.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Escárnio e maldizer
Mestria
Cobras singulares
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 172
(C 173)

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 172


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas