Gonçalo Anes do Vinhal


Abadessa, Nostro Senhor
vos gradesca, se lhi prouguer,
porque vos nembrastes de mi,
a sazom que m'era mester:
5u cheguei a vosso logar,
que tam bem mandastes pensar
i do vosso comendador!
  
Ca morto fora, mia senhor,
de gram lazeira, sei de pram;
10mais nembrastes-vos bem de mim,
e todos me preguntarám
se vos saberei eu servir
quam bem o soubestes guarnir
de quant'el havia sabor.
  
15Hajades por en galardom
de Deus, senhor, se a El praz,
porque vos nembrastes de mim,
u m'era mui mester assaz;
o comendador [i] chegou
20e se el bem nom albergou,
nom foi por vosso coraçom.
  
De[us] vos dê por en galardom
por mi, que eu nom poderei,
porque vos nembrastes de mim,
25quand'a vosso logar cheguei;
ca já d'amor e de prazer
nom podestes vós mais fazer
ao comendador entom.
  
Cento dobr'hajades por en
30por mi, que lhi nom minguou rem
de quant'havia na maison.



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Nota geral:

Embora o seu entendimento não seja totalmente claro, esta cantiga é uma sátira a uma abadessa em forma de agradecimento pelo generoso acolhimento recebido no mosteiro - presume-se que a todos os níveis, incluindo o sexual. O ponto obscuro da cantiga prende-se com a indeterminação de quem teria sido o destinatário de tão efusivo acolhimento, aqui designado por comendador. Três leituras são possíveis: ou o comendador seria o próprio trovador (que seria "herdeiro" desse mosteiro) e a mudança de sujeito, nos finais de cada estrofe, é uma irónica maneira de dizer que o tratamento a que tinha direito teria deixado muito a desejar; ou o comendador é um outro, que recebe todos os favores, enquanto o viajante cansado fica à porta. Ou D. Gonçalo aludirá aqui, na verdade, a uma qualquer usurpação dos seus legítimos direitos em matéria de comendas (situação semelhante à denunciada por um outro trovador, João Soares Coelho, na cantiga que dirige a Airas Peres de Vuitorom). Não sendo possível datar a cantiga, neste último caso, o contexto político da guerra civil portuguesa (1245-1247) seria o mais provável.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Escárnio e maldizer
Mestria
Cobras singulares (rima a dobla, rima c uníssona)
Palavra(s)-rima: (v. 1 de cada estrofe)
senhor (I, II), por en galardom (III, IV)
Palavra perduda: v. 3 de cada estrofe
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

V 1005

Cancioneiro da Vaticana - V 1005


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas