Estêvão da Guarda

Rubrica:

  

Estas cantigas de cima forom feitas a um jograr que se prezava d'estrólogo, e el nom sabia nada; e foi-se cercear, dizendo que haveria egreja, e fazer coroa, e [n]a cima ficou cerceado e nom houve egreja; e fezerom-lhe estas cantigas por en.


 Martim Vaasques da estrologia
 perdeu feúza, polo grand'engano
 dos planetas, per que veo a dano
em que tam muito ante s'atrevia:
 5ca o fezerom sem prol ordinhar
por egreja que lhe nom querem dar
 e per que lh'é defes'a jograria.
  
E per [que] esto, per que ant'el vivia,
lh'é defeso, des que foi ordinhado,
10oimais se tem el por desasperado
 da prol do mester e da clerezia:
e as planetas o tornaram fol,
sem egreja nem capela de prol
e sem o mester per que guarecia.
  
15E já de grado el renunçaria
sas ordĩins, per quant'eu hei apreso,
por lhe nom seer seu mester defeso
 nem er ficar em tanta peioria,
como ficar por devaneador
20coroado e, o que é peor,
perder a prol do mester que havia.
  
E na coroa, que rapar queria,
 leixa crecer a cient'o cabelo
e a vezes a cobre com capelo,
25o que ant'el mui d'anvidos faria;
mais del: quand'el a 'sperança perdeu
das planetas, des i log'entendeu
que per coroa prol nom tiraria.
  
E no seu livro, per que aprendeu
30astrologia, log'i prometeu
que nunca per el mais estudaria.



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Nota geral:

Como nos informa a rubrica, esta e as duas outras cantigas que se seguem nos mss. são dirigidas a este Martim Vasques, jogral, clérigo e astrólogo, igualmente chufado pelo conde D. Pedro, e pelos mesmos motivos: o de terem saído goradas as suas previsões astrológicas de arranjar uma boa paróquia, motivo pelo qual tinha tomado ordens e cortado (cerceado) o cabelo. A referência que a cantiga faz ao facto de, para cúmulo da desgraça, lhe ser "defes´a jograria" (proibida a atividade artística, o que deixa o desgraçado sem recursos), poderá aludir a uma qualquer postura proibindo os clérigos de trovar. Como nos diz López Aydillo1, vários concílios de bispos ibéricos legislaram nesse sentido, nomeadamente o de Talavera, em 1317. Também Afonso IV estabeleceu regras semelhantes, mas o seu único decreto conhecido nesta matéria, com data de 1352, é demasiado tardio para servir de referência a esta composição de Estêvão da Guarda.

Referências

1 López-Aydillo, Eugénio (1923), "Los cancioneros gallego-portugueses como fuentes históricas", in Revue Hispanique, Tome LVII, reimpressão do original publicado: Valladolid, Editorial Maxtor, 2008, p. 151.



Nota geral


Descrição

Cantiga de Escárnio e maldizer
Mestria
Cobras singulares
Finda
(Saber mais)


Fontes manuscritas

B 1323, V 928/929
(C 1323)

Cancioneiro da Biblioteca Nacional - B 1323

Cancioneiro da Vaticana - V 928/929


Versões musicais

Originais

Desconhecidas

Contrafactum

Desconhecidas

Composição/Recriação moderna

Desconhecidas