João Soares de Paiva Trovador medieval
Nacionalidade: Portuguesa
Notas biográficas:
Trovador português, nascido por volta da década de quarenta do século XII, João Soares de Paiva é o mais antigo autor com obra conservada presente nos cancioneiros medievais galego-portugueses. Filho de D. Soeiro Pais, dito o Mouro, e de D. Urraca Mendes de Bragança, cuja união se deverá ter processado nos anos seguintes à batalha de Ourique (onde faleceu o primeiro marido de D. Urraca), João Soares era oriundo de uma linhagem implantada nas margens do rio Paiva, a sul do Douro e descendente da importante linhagem dos Baião. Está documentado em Portugal em 1170 (numa doação que faz ao mosteiro de Paço de Sousa, fundado pelos Baião), data a partir da qual se deverá ter ausentado do país, ao que parece de forma definitiva, ou, pelo menos, muito prolongada. Na verdade, a sua única cantiga conservada, que se pode datar dos anos finais do século XII, indica-nos que se encontrava, na época, nas terras que detinha na fronteira navarra-castelhana-aragonesa. Desconhecemos os motivos que o teriam levado a sair de Portugal, mas, como sugere José Mattoso1, não é impossível que essa partida tivesse ocorrido na sequência da perda de Badajoz por D. Afonso Henriques (1169), hipótese que José António Souto Cabo reforça2, ao sublinhar as relações estreitas que a sua linhagem materna, os Braganções, mantinha com o reino de Leão, sendo o caso mais saliente o do seu tio (ou primo) materno, Mendo Mendes de Bragança, documentado como alferes de Fernando II (o vencedor de Badajoz) já em 1152. José Carlos Miranda, por sua vez, propôs que em algum momento João Soares se teria posto ao serviço de Rui Dias de los Cameros, poderoso senhor castelhano e também trovador (embora a sua obra, indicada no índice de Colocci, infelizmente se tenha perdido). Segundo este investigador, deverá ser João Soares o João de Paiva que, já em 1182, confirma uma venda efetuada em Villafranca do Bierzo, na fronteira de Leão com a Galiza, localização que corresponderia à zona de origem da mãe de Rui Dias, senhora galega da poderosa linhagem dos Trava. Razões geográficas parecem, no entanto, contrariar desde logo este hipótese, já que as terras de origem da mãe de Rui Dias eram o noroeste e sudoeste da Galiza, e não a região do Bierzo, como adianta Souto Cabo. Assim, no trabalho acima citado, este investigador discorda da proposta ligação de João Soares com o senhor dos Cameros, sugerindo que este documento de Villafranca, localidade de que era tenente, à época, o conde, de origem catalã, Armengol VII de Urgell, sobrinho do poderoso Pôncio II Geraldo de Cabrera (avô do trovador João Velaz), este documento, como dizíamos, confirmaria antes as ligações do trovador, através da sua linhagem materna, os Braganções, aos Cabrera-Velaz (linhagens cujas ligações os Nobiliários também atestam), desenhando, ao mesmo tempo, um outro contexto credível para a cantiga satírica de João Soares (dado o senhor de Villafranca ser, à época, um catalão, como dissemos). De resto, como Souto Cabo faz ainda notar, na referência acima citada do Livro do Deão o trovador é designado como "João Soares, o Freire", o que parece indiciar a sua pertença a alguma Ordem Militar. Seguindo esta pista, e também a que é dada pela referência elogiosa, na sua cantiga, ao "senhor de Monzón" (v. 7), praça que estava, desde 1143, na mão dos Templários (por doação do rei de Aragão), Souto Cabo crê muito possível que João Soares tenha pertencido a essa Ordem. Neste sentido, e dadas as evidentes relações textuais da sua cantiga com uma canção de cruzada do trouvère Conon de Béthune, composta no contexto da Terceira Cruzada, não é impossível que João Soares nela tenha igualmente participado. Seja como for, o certo é que não dispomos, pelo menos de momento, de dados documentais que nos esclareçam um pouco melhor sobre o percurso de João Soares de Paiva, incluindo a data em que terá falecido. Casou, em data igualmente indeterminada, com D. Maria Anes de Riba de Vizela, de quem teve cinco filhos (que parecem ter vivido em Portugal, dado uma delas ter sido monja do Lorvão). Acrescente-se, no entanto, que estes dados, que são os fornecidos em vários momentos pelos Livros de Linhagens (LD 6M6, LC 26C3, LC42W6), enquanto num outro o nome da mulher é uma D. Margarida, cidadã de Lisboa (LC62G7), são encarados com algum ceticismo por José Carlos Miranda, que crê poder ter havido alguma confusão com um homónimo, uma vez que Maria Anes parece pertencer, de facto, à geração seguinte (já quanto a D. Margarida, LC26G5 parece atestar que terá sido a esposa de seu neto, João Soares II). A não ser que João Soares de Paiva tenha efetivamente regressado a Portugal e se tenha casado tardiamente. Acrescente-se que, para além da cantiga de escárnio conservada, os cancioneiros incluíam ainda mais seis cantigas de amor deste trovador, como vem indicado no índice de Colocci, cantigas essas que não chegaram até nós por se encontrarem nos folios iniciais do Cancioneiro da Biblioteca Nacional, hoje perdidos.
Referências 1 Mattoso, José (2000), "A nobreza medieval portuguesa no contexto peninsular", in Naquele Tempo. Ensaios de História Medieval , Lisboa, Círculo de Leitores, p. 329.
2 Souto Cabo, José António (2012), Os cavaleiros que fizeram as cantigas. Aproximação às origens socioculturais da lírica galego-portuguesa, Niterói, Editora UFF, p. 57-70. Aceder à página Web
3 Miranda, José Carlos (2004), Aurs mezclatz ab argen. Sobre a primeira geração de trovadores galego-portugueses, Porto, Edições Guarecer, pp. 15-43.
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Ora faz host'o senhor de Navarra Cantiga de Escárnio e maldizer
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